Projecto Vercial

César Luís de Carvalho


César Luís de Carvalho

César Luís Marçal Monteiro de Carvalho nasceu no lugar de Marvão, freguesia de Loureiro, concelho do Peso da Régua, no dia 17 de Outubro de 1965. Viveu em Lamego, onde se tornou professor do 1.º Ciclo do Ensino Básico, e, mais tarde, em Tarouca, onde desenvolve, mais significativamente, a sua intervenção comunitária, como responsável pela Educação e Formação dos Adultos, e literária, enquanto incitador e assíduo apoiante de projectos de escrita. Para além de artigos dispersos pelos jornais regionais, tem vasta colaboração em livros, quer como co-autor e coordenador ou como prefaciador. Da sua obra fazem parte álbuns de banda desenhada, contos, biografias, poesia lírica e um romance. A sua escrita, marcadamente humanista, convida o leitor a experimentar as cores e os aromas da vida e das vidas que se vão desenrolando em seu redor. O recurso às descrições, o concurso permanente dos sentidos e o apelo solidário aos sentimentos impregnam de poesia as suas obras. Os leitores viajam, por entre os livros de César Luís de Carvalho, como viandantes alcançam incansáveis as serranias da Beira, ou como lavradores contam diligentes os bardos que exalam mel pelas encostam benfazejas do Douro.

Obras: Juntos, Pela Natureza, A Flor dos Gasalhos, O Natal é Hoje! (11.ª edição em 2004), Heitorzinho, Um Percurso de Bem, Fausto José, Poeta de Portugal, O Almocreve, Vontade de Nascer.



VONTADE DE NASCER

Viver!... E a poesia não será isso?...

Quando crias histórias de príncipes e de batalhas e de ursos e de leões, nas nuvens que mancham de algodão o céu azul; quando te deixas invadir pelo canto dos grilos ou pelo gorjeio dos rouxinóis, nas noites cálidas; quando te sacias com o odor da terra molhada depois da chuva estival; quando descobres sinfonias nas águas marulhantes do riacho; quando, enlevado, segues o bailado da folha impelida pelo Outono ou testemunhas o rebento que a Primavera empertiga; quando acaricias o musgo que adocica a rocha agreste; quando beijas ou quando choras, ou quando deixas que no teu rosto desponte um sorriso... quando ajeitas o cabelo daquela que tu bem sabes... estás a poetar! Pois que é de Poesia que todos estes momentos são feitos. Momentos de que alguns nos falam... com cinzeladas perenes em rochas de papel.

São os poetas!...


O ALMOCREVE

É!... É uma mistura de sensações esquisitas, uma panóplia de pensamentos sem nexo, é um estado de espírito difícil de qualificar, aquele que assalta, domina e preenche todo o ser de quem se dispõe a apresentar um seu escrito, recém-acabado.

É!... É tarefa árdua, a de elaborar a introdução de um texto que resulta do acto de escrever, na sua essência.

As páginas que se seguem não são, porém, mero refúgio de escrevedor que se isola; não são fuga ofegante, exasperada, de dias densos, plenos de nada; não são gritos mudos, de dores criadoras, nem ânsia de liberdade; nem aquela necessidade de abarcar, com a pena, o mundo inteiro; tampouco, confidência, egoísmo, exercício ocioso...

Não!... Na verdade, o que se poderá vislumbrar são... as montanhas que, fugindo dos vales, se agigantam imponentes, demolidoras, mas graciosas, até ao horizonte.

O refúgio encontra-se lá mesmo, nas serranias, nas rochas feitas castelos que pintalgam de prata as encostas e os cumes. E nos castanheiros velhos como os montes, e nas carvalhas e pinheiros, guardiões de mil segredos.

A fuga, essa... não fossem as veredas e os carreiros que retalham, impiedosos, rebeldes e fugidios, as paisagens, e seria difícil o apelo da serra. O apelo de uma liberdade que esmaga, e que se adivinha em cada urze, em cada giesta e regato, em cada gota de orvalho, erva daninha ou canto de pássaro.

Tal como o escrever, a montanha é isso: liberdade. Mas também enigma, chão confidente que se prolonga, prolonga... e é bela como a flor do tojo, feliz como a nascente que cresce, cresce... graciosa como o veludo do musgo frágil que suaviza o penedo imenso.

E o silêncio?

O silêncio, na serra como na escrita, é tensão ensurdecedora, acalmia que perturba, perene e presente; mas orienta, esclarece, liberta a pena de quem se aventura pelas brumas de uma Natureza generosa.

Na verdade, o que a pena espera que se descubra nas páginas que se seguem, é o sentir de uma Natureza que é Mãe, Amor e Deus.

Oh, Natureza! Nobre testemunha de Vida! E de vidas! Fiel companheira de quem se aventura pelos chãos fora, noite dentro, com a serra feita rumo e a vida como meta.

Eram assim os almocreves.

Homens de fibra, esculpidos pelas intempéries, filhos do vento e da noite... irmãos do sincelo, do ocaso e da aventura.

Eis, pois, um testemunho de uma época. A marca indelével de um agir, de um sentir, de um viver genuíno: O Almocreve.



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