Projecto Vercial

Manuel de Figueiredo


Manuel de Figueiredo (1725-1801) foi o autor português do século XVIII que mais peças de teatro escreveu e publicou. É ele o principal representante do teatro neoclássico em Portugal que, diga-se de passagem, para lá dos meios intelectuais, pouca aceitação teve por parte do público. Manuel de Figueiredo entra em 1756 para a Arcádia Lusitana a convite de Correia Garção e adopta o pseudónimo literário de Licíadas Cíntio.

A sua actividade literária decorre em dois períodos distintos: o primeiro de 1748 a 1764 e coincidindo com o espírito de renovação da Arcádia. Deste período é a tragédia Viriato. Esta tragédia, terminada de compor em 1757, foi apresentada à Arcádia Lusitana e sobre ela teceram-se algumas críticas elogiosas. Não chegou a ser representada, aliás como a maior parte das 46 peças do autor. A tragédia Viriato iria Figueiredo mais tarde irrelevá-la juntamente com outras. Diz ele a propósito desse primeiro período da sua criação literária: «apresentei um Édipo, que não sei a que folhas vai, compuz nesse tempo uma tragédia da morte de Viriato, que levou o mesmo caminho, e me não fazem saudades.»

No segundo período, de 1768 a 1777, o autor empenha-se na renovação moral da sociedade através das suas peças. Deste período é a tragédia Ósmia, ou a Lusitana (1773). Nota-se neste período um desfazamento entre os gostos do público e aquilo que Manuel de Figueiredo teima em escrever. O próprio autor reconhece isso, não sem um pouco de mágoa: «eu escrevo, escrevi, e escreverei, sempre mais para o entendimento, que para os sentidos; mais para fazer os homnes melhores do que para os fazer rir, e chorar».

Diz Laureano Silveira que «Manuel de Figueiredo foi um homem que pretendeu em todos os campo ir contra a corrente. Quando todo o público exigia obras satíricas e cómicas, o autor insurgia-se contra a classificação de satírico dada ao seu teatro, carregando-o ao mesmo tempo de uma moralidade tão indigesta que o condenou definitivamente.»

A crítica está de acordo em afirmar que as obras de Manuel de Figueiredo, além de enfadonhas para quem as lê, se mostram falhas no estilo e na originalidade. Laureano Carreira, autor contemporâneo que estudou a fundo o teatro do século XVIII em Portugal, afirma: «no que se refere à tragédia falta a Figueiredo o verdadeiro talento para levar a barca a bom porto. O autor não tem quaisquer exigências formais».

Almeida Garrett, no prefácio da sua tradução do Catão (1839), escrevendo algumas palavras de louvor à honradez e à erudição ao autor, não deixa de confirmar a crítica: «o honrado Manuel de Figueiredo, de cujo volumoso teatro poucos sabem até que existe: lê-lo, isso é para exemplares paciências. Pois ganha muito quem o fizer, que há ali oiro de Énio com que fazer muitos Virgílios».



VIRIATO

Resumo: A tragédia funda-se na traição a Viriato. Quem são os traidores? Os suspeitos eram os autênticos amigos de Viriato e para isso contribuiu um grupo de estrangeiros que militavam no exército de Viriato, já que os lusitanos preferiam morrer do que trair a sua pátria. Há uma cerimónia em honra da Deusa Paz em que participam os soldados estrangeiros e os lusitanos recusam-se a participar, pois achavam que era tempo de pensar na guerra, pois os romanos ainda não tinham sido vencidos. Isso leva a que os outros os acusem de traição ao quererem a perdição do exército.

Táutalo é o general lusitano que toma voz e denuncia os intentos de traição dos generais estrangeiros. Dictalião insurge-se contra ele e procura desacreditá-lo junto de Viriato. Este, ingénuo, acredita nas palavras de Dictalião.

Mas afinal são os outros, os que maquinaram a alteração de culpas, a revelarem-se os verdadeiros traidores, feitos que estavam com os romanos. Mas Viriato, fiado na palavra dos falsos amigos, só descobriu depois de ser ferido e estar a esvair-se em sangue.


Extractos:

TÂNTALO: Bárbaros Lusitanos, que Deidade
Tira do altar de Marte os sacrifícios?
À Paz, bárbaro povo, à Paz oferendas?
Cantais hinos àquela Deusa injusta,
Que nos tem abusado tantas vezes
Na falsa confiança dos Romanos?
Que nos tem malogrado as conjunturas
De os ver inteiramente destruídos?
Deixai essas insígnias aos cobardes.

DICTALIÃO:Não venhas perturbar, Tântalo injusto,
Nossos ritos sagrados.

TÂNTALO: Eu te vejo,
Indigno Dictalião, Tício perverso,
Querer interessar a Divindade
Na traição que maquinas; como vejo
Em tal superstição bem confirmada
A suspeita de teus pretextos falsos,
Com que o grande valor das nossas gentes
Amoleces, traidor.

DICTALIÃO: Traidor?

TÂNTALO: Traidor cobarde,
E traidores Aulaces, e Minuro:
Estremece de veres descobertos
Teus malignos intentos: Lusitanos,
Lavai a vossa mancha, vinde todos
Ratificar nas Aras do Deus Marte
Os vossos juramentos contra Roma.

 

DICTALIÃO:É da Paz tão notório benefício,
Que nenhum dos mortais pode ocultar-se:
Por ela toda a tropa se interessa;
Mas Tântalo, que espera seus aumentos
Não da glória da Pátria, mas de indignas
Sugestões do artifício dos Romanos,
Por encobrir seus pérfidos desígnios,
Se quer mostrar zeloso; aos Comandantes
Das Tropas Aliadas, de traidores
Infama; se souberas o motivo...
Mas bastará dizer, que te acauteles.

VIRIATO: Que me acautele?

DICTALIÃO: Sim: que a Paz somente
Se não vê confirmada, porque Roma
Espera consegui-la a menos preço.
O retiro do Cônsul bem te mostra
Tanto artifício. Aulaces, e Minuro
Bem deixam compreender no que te dizem,
Que têm já descoberto este segredo.

VIRIATO: Que dizes, Dictalião?

O seu desígnio
É prevenir nos más inteligências,
Que maquina entre os meus, e seus Soldados
O fruto da desordem; porque agoura
Sobre o total destroço dessas gentes
(Mal entendida glória do teu nome)
Sua ambição, e inveja satisfeita;
Recebendo por dom desses tiranos
O que alcançaste em prémio da virtude.

DICTALIÃO:Não cabem, Dictalião, no ilustre peito
Lusitano tão bárbaros projectos.
Não cabem na virtude dos Romanos

Tão perversas maldades;

VIRIATO: Ah, desgraçada Lísia! Ah, liberdade!
Pouco importara, Deuses, que eu morrera,
Se deste amor da Pátria o ilustre exemplo
Não visse na traição quasi perdido.
Não julgo Viriato ser eterno;
Mas nunca presumiu que a alguém lembrasse
A sujeição de Lísia enquanto lessem,
Enquanto lessem nos fatais sepulcros
As causas da vingança; enquanto vissem
Pendente o juramento; enquanto o sangue
Desta raça imortal não fosse extinto.
É pânico o terror, indigno o susto;
É Tício Dictalião: é Lusitano
O valeroso Tântalo: em vão Roma
Contaminar pretende a fé constante
Da gente ilustre, e forte; um vil aborto
Não pode perverter-lhe a natureza:
Introduzir horrores na minha alma!
Se morrer Viriato, a amada Pátria
Tem segura o valor da forte gente.

Produza um vil traidor a grande Lísia...

BELISAURO:Lembra-te, Viriato, aquele estado,
Em que choraste a Pátria, em que a viste,
E o Povo Lusitano reduzido
A receber as leis de Roma; e nunca
Chegara a sacudir o infame jugo,
Se tu não foras: nascem já guerreiros
Os Lusitanos, sim, porém dependem
Os sucessos das armas inconstantes
Mais de seus Capitães, que dos Soldados;
Fortes feitos, esforços generosos
Verás nas tuas gentes, que te lembrem
Emiliano, e Lélio; mas o mundo
Tarde outro Herói terá de quem nos diga,
Assim foi Viriato?

VIRIATO: Veja a Lísia
Temer a morte àquele, que fundava
No desprezo da vida toda a glória.

 
(...)

VIRIATO: Impossível, impossível
Me parece o que passa enquanto mando,
Enquanto determino; considero
Mais a injúria que faço, que o perigo,
Em que me vejo: oh Céus! o amor da Pátria,
O valor de tal gente, a fé constante
Respeito nessas mesmas repugnâncias

Da pronta execução das minhas ordens;

VIRIATO: A traição contamine os nobres peitos:
Mas é forçoso agora sustentá-los
Por crédito da mesma disciplina.

DICTALIÃO: Vê que nos afectados pundonores
Obras mais a traição do Comandante,
Que o marcial capricho dos Soldados;
E que uma vez perdidos os respeitos
De cega obediência, em qualquer ordem
Descobrirão pretextos arrogantes

Para interpretar sempre teus mandados.

DICTALIÃO: Eles são de traidores convencidos,
Outro modo não tens de preservar-te;
Vê se queres depois de tanta glória
Arriscar o sucesso temerário:
Os dois Embaixadores hoje sabes
Que hão-de entrar neste campo; e se duvidas
Da traição que te juro, faze ao menos
Executar as ordens, com pretexto
De qualquer incidente, enquanto chegam;
Que se à vista das provas, que te derem
Daquela inteligência, o teu destino
Infeliz prevalece, restaurada
Ficará a vil infâmia dos traidores:
Sacrifica o valor hoje à prudência,
senão já pela vida, pela Pátria.

VIRIATO: Sempre indigna será de Viriato
Uma prudência, que parece medo:
Um terror, com que infamo a Lusitânia,

Se faz mais detestável que a conquista.

(...)

VIRIATO: nas caras
Estava escrito o firme sentimento
Daquelas almas nobres, que se rendem,

Aclamando-me todos Pai da Pátria.


VIRIATO: nas caras
Estava escrito o firme sentimento
Daquelas almas nobres, que se rendem,

Aclamando-me todos Pai da Pátria.


VIRIATO: Deuses, quem pode
Executar o golpe?... executá-lo...
Quem se pode atrever, se tem abertos

Os olhos Viriato, e o ferro ao lado?

TÂNTALO: Em ti vemos o antigo amor da Pátria,
Que empregado em favor da liberdade
Nos preservou do jugo dos Romanos.
Maus seus procedimentos sempre indignos
Nos fazem cada vez mais suspeitosa
A prometida fé. Muda o governo,

Ou já pela vingança, ou pelo susto.

TÂNTALO: Que importa que nos fastos dos Romanos
Cause espantos a nossa liberdade,
Se depois de ganhar tantas batalhas
Se reduz á defensa o vencimento?
Que importa que o valor da nossa gente
Assuste o Capitólio, assombre Roma,
Se na perda fatal da tua vida
Nos estremece o fim da Lusitânia?
Repara que o Senado mais astuto
Que guerreiro conspira, já conhece
Que para conseguir o nosso estrago
São mais próprias indústrias de Servílio
Do que esforços de Cláudio: não vês como
Escarmentada já, cede a vitória,
Buscando nas Províncias mais distantes
A força do artifício, e não das armas?
Não pretende a República o destroço
Do Lusitano Povo; à tua cabeça
Preparam duro golpe os seus tiranos,
Como objecto do bárbaro triunfo
Regulam pelos nomes das Províncias
O do Conquistador; mas quando o erigem
Para esta última parte das Espanhas,
Não lhe dizem, Senhor, que o mandam contra
A Lusitânia, sim contra Viriato.

VIRIATO: Suspende vil terror, Tântalo indigno,
Descrédito do esforço Lusitano.
Suspende a infame voz; que o falso zelo
Com que a Pátria, me descobre
Que serão mais fatais os teus malvados,
Aleivosos intentos, que os desígnios

Dos comuns inimigos do Universo.

VIRIATO: Se a República intenta unicamente
A minha morte, infame, que te assusta?
Pois com ela perdidos os temores,
Que o meu valor lhe infunde, às suas conquistas

Vos presumirá Roma necessários.

VIRIATO: Quantas vezes me rendo ao sono, tantas
A minha fantasia representa,
Que introduzo o braço nas feridas
Nas lástimas renova os juramentos.
Quantas vezes acordo estremecido,
Tantas banhado em lágrimas o rosto,
Malogrado o primeiro desengano,

Busco nas mãos o estímulo à vingança.


VIRIATO: Ilustres Lusitanos, armas, armas,
Disponha o sangue as terras às lavouras,
Que de outro modo enquanto houver Romanos,
Nem sereis Lavradores, nem Soldados:
Voltai, disponde a marcha prontamente,
Percam-se muito embora as sementeiras;
E porque nunca mais a rude gente
Por tão vil interesse constrangida
Nos torne a balançar a liberdade,
De uma vez o motivo se desterre,

Rompam-se as fouces, quebrem-se os arados.

VIRIATO: Por serviço da Pátria, por livrar-me
Da vil mancha de ingrato, move aquele
Bárbaro coração, Tântalo injusto,
Que quer por um capricho temerário
Deslustrar não somente a minha glória,
Mas arriscar a paz, que a altiva Roma
Terá justos motivos de rompê-la
Logo que saiba o horror daquelas mortes,
Devendo suspeitar que presumimos
Que traidor um seu Cônsul quis vilmente
Contaminar os meus Embaixadores.

TÂNTALO: Ah desgraçada Lísia, ah cara Pátria,
Generosos Patrícios, mais não posso
Fazer patente ao mundo a lealdade.
Por ela de traidor, de tumultuoso,
De indevoto, e de bárbaro me acusa
O grande Viriato: acabo infame
Por morrer bom Soldado: mas que exemplo
Não deixarei nos séculos futuros
Àqueles capitães, que pretendem
Antepor à lealdade Lusitana
A fé de estranhas gentes? Que escarmento
Se tanto não custará a triste Lísia?
Morrerá Viriato às mãos infames
Desses contaminados estrangeiros,
Sepultando teu erro indesculpável
A lembrança de acções de tanta glória,
Glória, sim, conseguida em tantos feitos.


Cena final:

VIRIATO: Já vês patente aquela má suspeita.
Expirou Viriato.
TÂNTALO: Ah, vis traidores.
VIRIATO: Aquelas mãos infames; mas eu mesmo...
Apuleio:Eu fui Senhor, eu fui quem te deu morte;
Porque detive Tântalo, querendo
Evitar ao teu lado o fatal golpe
VIRIATO: Preferindo a política à lealdade,
Desprezando o conselho dos Patrícios,
Acreditando a fé de estranhas gentes,
Dos primeiros desígnios preocupado,
Cegando-me imprudente amor da Pátria,
Malogrei os avisos, que me dava
A sábia Providência nas desordens,
Que os falsos estrangeiros maquinavam
No meu guerreiro Exército, naqueles...
Apuleio:Mas como, Senhor, como se atreveram?
VIRIATO: Do modo que podiam atrever-se:
Dormindo me encontraram: tão suspensos
Ficaram todos quando os olhos abro,
Que o vil temor os deixa desarmados,
Não podendo acabar o indigno intento
No repetido golpe, que empreendiam.

VIRIATO: Os Romanos, Patrícios, os Romanos
Vingarão minha morte no desprezo
De tão vis assassinos; os Romanos
Castigarão no bárbaro Servílio
A traição, que estranharam tanto em Galba;
Catões haverá sempre no Senado.
Expiro, Lusitanos; porém vendo
No generoso alento desses peitos
Aquele cego amor da liberdade,
Que vos inspirei sempre, à minha Pátria
É mais útil o exemplo, que vos deixo,
Do que os débeis esforços do meu braço.
Inútil vedes já com os Romanos
A boa fé; traidores esses mesmos,
Que gemerão no infame cativeiro
Sem a nossa amizade.

VIRIATO: Armas, Patrícios, armas. Lá no inferno
Descontarei aquele sentimento
De não servir-te mais, ó Lusitânia,
Quando os campos Elísios vir cobertos
Dessas almas Romanas; quando escute
Por tão justificadas testemunhas
A narração fatal de vossos feitos,
E conheça no estrago das feridas
Distintamente os braços poderosos
Do esforçado Apuleio, do invencível
Generoso Amastor, do forte Arsílio,
Do vingativo Tântalo. Patrícios
Amados, invencíveis Lusitanos,
Já desfaleço; vinde, vinde, filhos,
Meter todos as mãos nesta ferida,
Renovar os antigos juramentos
Contra Roma; jurai, jurai.
Portugueses: Juramos.
VIRIATO: Jurai defender a liberdade,
De preferir a tudo a vossa Pátria,
De não vos esquecer a minha morte
Enquanto, sim, ó Céus, nossas bandeiras
Não chegais a arvorar no Capitólio.


ÓSMIA, OU A LUSITANA

Acto segundo


TÂNTALO: Escapámos, Erécia, como digo,
Com mui poucos da Plebe, àquela negra
Original traição, que os Céus, e os Deuses
Hão-de justos punir, e a mesma Roma.
Por nem de humanos é, e muito menos
De sábio General, e de político
Conquistador, chamar-nos: prometer,
(Com a voz do Senado, e a fé de Roma)
Prometer, não somente de assinar
Ventajosos Tratados, a que o mesmo
Execrando Pretor assinalara
Todas as condições, mas de aumentar
Com mais povoações, com férteis campos
Tão estreitos Domínios, à medida,
À proporção dos grandes corações
Da gente Lusitana, da amizade,
Daquela aflição, com que a República
Seu valor respeitava; e de improviso
Caírem sobre nós (sem mais defesa
Do que a falsa palavra) tantas forças,
(Tal era o seu temor) quantas tem Roma
Divididas por ambas as Espanhas.
E com que impiedade! Um só, Erécia,
Uma só testemunha não deixaram,
Que transmitir pudesse fielmente
Nem à posteridade, nem levar
À presença do Ínclito Senado,
A perfídia de Galba: (tanto o indigno
Conhecia a maldade) Se um dos nossos,
Dos últimos da Plebe, um Viriato,
Um Caçador traçando o seu cajado,
Não abrisse por entre as legiões
Dos feros inimigos (espantados
Ou já do atrevimento, ou comovidos
Por tal heroicidade) largo passo,
Com que nos pôs em salvo. Reunidos,
Nos conduziu, dous dias já passados,
Ao desgraçado campo: que espectáculo!
A mortandade não, não nos assombra.
Maior campo juncámos de Romanos
Por infindas vezes; e dos nossos,
Mais terra viu coberta, em mil combates
Inteiro o coração, enxuto o rosto.

(...)

TÂNTALO: Desculpa-me antepor à natureza
Fantasias de amor, humana lembrança
Indigna da modéstia, e da virtude
Dessa minha adorada, infeliz Ósmia.
Sucederam à lástima os furores.
Rebentaram as lágrimas nos olhos
Do segundo Apimano... Tendes visto?
(Exclama Viriato, e a voz de ferro
Os cabelos levanta, e em movimento
Põe o gelado sangue) Tendes visito?
A proeza, a façanha dos soberbos
Vassalos do Senado, que se diz
Conquistador do Mundo? Que se faz
Arbítrio, vencedor já do Universo?
Mulheres e crianças degoladas.
E nós o sofremos? Lusitanos?
A glória nos convida: clama o sangue:
Pede vingança a Pátria. O vosso nome
Se fará imortal, nos mesmos fastos
Do soberbo inimigo. Sim, vinguemos
Tantas Nações dos bárbaros, que fez
Célebre a fraqueza dos contrários,
Seus negros atentados; não valor,
Não virtude. Poder, Justiça, os Deuses,
Tudo, tudo é por nós. Sim, confirmemos
Aquele ódio mortal, que tantas vezes
Jurámos contra Roma. Contra Roma
Conjuremos a terra.
E pondo a mão
Nas medonhas feridas de uma dessas
Infelizes donzelas, e invocando
Todo o Inferno, jura, juram todos,
De não largar as Armas, sem primeiro
Vingarem suas mortes.

Voltar à página inicial

Site apoiado pelo Alfarrábio da Universidade do Minho | © 1996-2015 Projecto Vercial