Letras & Letras

Ensaios


Questões femininas na obra de Gil Vicente

I – INTRODUÇÃO

Não passará despercebida ao leitor de Gil Vicente a presença constante de personagens femininas, a começar pelo Auto da visitação (ou Monólogo do vaqueiro), sua primeira produção teatral, em 1502, "que o autor fez ao parto da muito esclarecida Rainha Dona Maria, e nascimento do muito alto e excelente Príncipe Dom João", como nos informa a didascália do referido auto. A partir de então, também se torna relevante o fato de que, das 44 peças escritas por Gil Vicente, 20 foram por encomenda ou intenção de rainhas; a benéfica proteção que recebeu da rainha D. Leonor e o fato de que o "Privilégio Real" para a publicação da Compilação de todalas obras de Gil Vicente tenha sido assinado por uma rainha, D. Catarina, em 1561.

As manifestações do agrado feminino em relação às obras do dramaturgo foram imediatas. Dona Leonor ficou tão satisfeita com o Monólogo do vaqueiro que pediu a Gil Vicente, para o dia de Reis, outra obra, e a seguir mais outra, e assim sucessivamente, o que levou muitos estudiosos, entre eles Marques Braga, a se referirem ao poeta como "o comediógrafo de D. Leonor" (1).

Gil Vicente deu um tratamento especial à mulher, e isto, percebido pela aguda sensibilidade feminina, certamente lhe valeu a simpatia de nobres e plebéias.

A condição da mulher portuguesa da Idade Média até meados do século XVIII era, geralmente, de encarcerada. A vida social praticamente não existia, e só passaria a existir a com saraus, bailes e valsas que tanto entusiasmaram os poetas românticos. O deslocamento do lar para o espaço da rua só começa a acontecer com freqüência e com menos restrições no século XIX, tanto em Portugal como no Brasil. No século XVI, as donzelas portuguesas só saiam para irem às igrejas, e de véu sobre o rosto para não serem vistas; as esposas eram escravas do lar, numa terra onde os mouros permaneceram demasiadamente e à qual legaram preconceitos e restrições nefastas em relação às mulheres.

As casadas, segundo nos informam os cronistas da época, não andavam na rua sem o marido, a menos que estivessem acompanhadas por várias damas e escudeiros, ou então adquiririam má fama. A viúva que se casasse pela terceira vez ou contraísse segundas núpcias, tendo muitos filhos, podia contar com a rejeição das outras mulheres. Normalmente, ser viúva era estar morta para o mundo; e muitas se retiravam para os mosteiros ou se enclausuravam em casa, como D. Antonieta de Vilhena, filha do Barão de Altivo, por isso mesmo chamada "viúva da observância".

Dona Beatriz, filha de D. Fernando, enviuvando do rei D. João de Castela, respondeu à embaixada que o Arquiduque da Áustria lhe enviou que "as mulheres como ela não se casavam duas vezes". Situação não menos pior era a das mulheres casadas cujos maridos estivessem em terras distantes a bem da expansão marítima. Estas, assim como as prometidas cujos noivos morressem, também se comportavam como viúvas. Até hoje vê-se em Portugal senhoras vestidas de negro a indicarem que o marido emigrou para o Brasil, África ou algum país mais abastado da Europa.

As mulheres portuguesas da época de Gil Vicente não jogavam cartas, nem tomavam vinho, a menos que este fosse recomendado pelo médico, geralmente contra a esterilidade, o que, em tom jocoso, podemos dizer que talvez funcionasse, por desreprimi-las um pouco.

Em Gil Vicente, as mulheres encontraram um defensor, e talvez por isso o ampararam e estimularam o seu gênio. Muitas das personagens femininas retratam a psicologia da mulher do século XVI e (Por que não?) a de algumas do nosso tempo: suas angústias, contradições e questionamentos; seus anseios de liberdade, igualdade e respeito; seus desejos de ascensão material e espiritual, denunciando muitas vezes o jugo dos homens, a falsa vassalagem e o amor cortês, retóricas enganadoras que terminavam depois da sedução.

Entre as mulheres tão habilmente descritas por Gil Vicente, algumas, pela consistência das suas personalidades ou pelas marcas existenciais que carregam, ganharam expressividade. Entre elas, Sibila Cassandra, Mofina Mendes, Isabel, Rubena e sua filha Cismena, Domicilia e Dorisia, Oriana e Flérida, Juliana e Ilária; mulheres que talvez nos esclareçam melhor porque Gil Vicente é tão querido por elas através dos séculos.

II – HEROÍNAS VICENTINAS

Da encenação do Monólogo do vaqueiro, em 1502, até o ano de 1513, com o Auto da Sibila Cassandra, Gil Vicente só criara uma personagem feminina marcante. Criou-a no Auto da Índia, em 1510, e, no decorrer da peça, aparece uma única vez o nome Constança, sinônimo de fidelidade, nome que atribuído à personagem, não chega a ser a sua marca. Trata-se tão somente de uma Ama, mulher de um soldado, e que faz vida alegre enquanto o marido se encontra ausente, embarcado para a Índia. Essa Ama, caracterizada como adúltera, seria socialmente condenada, não fosse a habilidade de Gil Vicente em apresentar, através do discurso da mulher, certos argumentos que lhe diminuem a culpa ou procuram justificá-la. É com esse intuito, por exemplo, que a Ama diz à Criada:

"Partem em maio daqui,
quando o sangue novo atiça...
parece-te que é justiça?" (2)

Gil Vicente, conquanto caracterize uma adúltera, não deixa de abrir espaço para a reflexão de seu público antes que este condene a mulher abandonada ao lar, enquanto o marido, por ambições próprias, partia em busca de riqueza e glória em terras estrangeiras, sem a certeza de retornar.

A esse respeito, convém transcrever uma nota de Maria de Lourdes Saraiva da edição que fez das sátiras sociais de Gil Vicente:

"Só regressavam a Lisboa pequena parte dos que saíam para a Índia. Diogo do Couto conta que, dos 4000 homens da armada em que viajou para o Oriente, só 2000 chegaram vivos a Goa. Vários outros escritores referem a mesma proporção de metade de mortes durante a viagem de ida. Pyrard de Laval diz mesmo ter visto chegarem a Goa com 200 homens navios partidos do Tejo com 1000 a 1200. A essas perdas enormes acresciam as da estadia na Índia, cujo clima os portugueses suportavam mal, e as do regresso, que era mais rápido que a ida, mas durante o qual eram mais freqüentes os naufrágios, por causa da excessiva carga das naus" (3).

Pode-se crer que o adultério fosse comum entre as mulheres portuguesas de então, após a partida do marido para a Índias, e que Gil Vicente pretendesse, com humor e ironia, teatralizar esse fato. Mas o Auto da Índia, com ser uma sátira social, não deixa de denunciar a condição de abandono e viuvez anacrônica da mulher portuguesa, que, através da Ama do Auto da Índia, desabafa:

"Pera que é envelhecer
esperando polo vento?" (V, 6-7, p. 94)

Apenas em 1513, Gil Vicente criaria sua primeira grande personagem feminina, Sibila Cassandra, no auto que leva o seu nome. Mas o Auto da Índia antecipa algumas afirmações que terão curso nas falas de outras mulheres, como, por exemplo, aquela que acaba por transforma-se em provérbio no século XVII ("Mãe, que coisa é casar? Sofrer, parir e fiar"), monotonia recusada pela personagem do Auto da Índia:

"Mostra-m’essa roca cá:
siquer fiarei um fio." (V, 15-6, p. 92)

Ou na fala mascarada da Ama, quando diz o realmente não pensa:


"Onde não há marido
cuidai que tudo é tristura,
não há prazer nem folgura;
sabei que é viver perdido. (V, 16-20, p. 114)

As paráfrases desses versos, logicamente com a supressão do advérbio de negação, aparecerão várias vezes nos autos vicentinos, a mostrar a condição de ser mal casada ou o receio de casar manifestado por algumas das suas personagens, entre elas, Sibila Cassandra.

2.1 – Sibila Cassandra: a opção de ser livre

Para Neil Miller, no Auto da Sibila Cassandra, "Gil Vicente tentou criar uma síntese artística de fusão das três tradições, pagã, judaica e cristã, dentro do marco católico" (4). Daí a presença de personagens como Salomão, Erutea, Ciméria, Esaías, Moisés e Abraão no auto que trata da "presunção da Sibila Cassandra, que, como por espírito profético soubesse o mistério da encarnação, presumiu que ela era a virgem de quem o Senhor havia de nascer. E com esta opinião nunca quis casar", conforme a síntese apresentada na didascália vicentina. Contudo, fica-nos claro que Cassandra pretendia guarda-se para mãe de Jesus porque, afora a honra que lhe seria atribuída e para a qual se julgava preparada, tinha horror ao casamento e julgava que nenhum pastor a merecia:

"Cual será pastor nacido
tan polido
ahotas que me meresca!
alguno hay que me peresca
en cuerpo, vista y sentido? (I, p. 49)

E é essa presunção que lhe retira a perfeição necessária para aproximar-se do ideal cristão da Virgem Maria, conforme o julgamento de Isaías, e que serve para, por contraste, realçar as qualidades da mãe de Jesus:

"Tú eres della al revés,
si bien ves:
porque tú eres humosa,
soberbia y presuntuosa,
que es la cosa
que mas desviada es.
La madre de Dios sin par,
es de notar,
que humildosa ha de nascer,
y humildosa conceber,
y humildosa ha de criar." (I, p. 71)

Mas por que Sibila teria horror ao casamento? Ela própria é quem, denunciando a situação da esposa portuguesa, desfia as razões de não querer privar-se da sua liberdade:

"Cual es la dama polida,
que sua vida
juega, pues pierde casando,
su liberdade cautivando,
otorgando
que sea siempre vencida,
desterrada en mano agena,
siempre em pena,
abatida e sojusgada?
Y piensan que ser casada
que es alguna buena estrena!" (I, p. 50)

A aversão de Sibila não é ao amor, mas sim ao fato de ver o casamento como uma forma de desterro em mão alheia, uma condenação ao sofrimento, ao abatimento e à subjugação. Sibila Cassandra alega, entre outras razões, a curteza da lua de mel e o mau feitio dos homens. Suas certezas vêm das queixas de outras mulheres:

"Veo quejar las vecinas
de malinas
condiciones de maridos:
unos de ensoberbecidos
y aborridos,
otros de medio gallinas,
otros llenos de mil celos
y recelos,
siempre aguzando cuchillos,
sospechosos, amarillos,
y malditos de los cielos:

Otros à garzonear
por el lugar,
pavonando tras garcetas,
si dejar blancas ni prietas
y reprietas,
y la muger? sospirar,
despus en casa reñir
y gruñir
de la triste alli cautiva.
Nunca la vida me viva,
si tal cosa consentir.

Y pues eres cuerdo y sientes,
para mientes:
Muger quiere decir moleja;
es ansi como una oveja
en pelleja,
sin armas, fuerzas ni dientes:
y si falta sentido
al marido
de la razon y virtud,
ay de niña juventud,
que en tales manos se vido!" (I, p. 54-5)

Através do seu propósito de reservar-se para mãe de Jesus, Cassandra vai pregando a libertação da mulher. Depois do diálogo com Salomão, a quem rejeita como marido, Sibila canta:

"Dicen que me case yo:
no quiero marido, no.
Mas quiero vivir segura
nesta sierra á mi soltura,
que no estar en ventura
si casaré bien ó no.

Dicen que me case yo;
no quiero marido, no.

Madre, no seré casada,
por no ver vida cansada,
ó quizá mal empleada
la gracia que Dios me dió.

Dicen que me case yo;
no quiero marido no." (I, p. 57-8)

Ao colocar nos lábios de Sibila uma canção de sabor popular, é como se Gil Vicente pretendesse aumentar o círculo de mulheres avessas ao casamento. Sibila, presumivelmente, apenas reproduz versos que andam na boca do povo, o que generaliza os sentimentos da mulher portuguesa da época em relação ao matrimônio: a preocupação de casar-se bem ou mal, a diferença apenas fonética (pela nasalação do /a/) entre "casada" e "cansada", a antevisão da clausura e da escravidão.

Sibila Cassandra aproveita para denunciar a falsidade do amor cortês, que tinha formas complicadas e estilizadas que "mascaravam, ou melhor, invertiam a realidade: o homem aparecia como um servidor submisso, inteiramente desinteressado; a mulher como um suserano todo poderoso em face do vassalo" (5), situação que se mantinha, como se verá na Farsa de Inês Pereira, até que o homem conquistasse o coração feminino. E Cassandra mostra consciência disso, quando diz:

"Oh cuantos ha ho solteros
placenteros,
de muy blandas condiciones,
y casados son leones
y dragones,
y diablos verdaderos!" (I, p. 60)

A afirmação de Cassandra denuncia o amor cortês, imortalizado nas cantigas medievais, apenas como uma convenção poética, um meio de ocultar a verdadeira condição da mulher.

Moisés, no entanto, argumenta:

"Blasfemas; que el casamiento
es sacramento,
y el primero que fué." (I, p. 63)

Sibila não nega que este seja obra divina, e de tal coisa não fala, mas replica dizendo que por obra do diabo "toda glória le es defunta" (I, p.66). Para Cassandra,


"Como puede sin pasion
y alteracion
conservar-se el casamiento?
Muda-se el contentamiento,
en um momento,
en contraria division.

Solo Dios es perfeccion:
si enrazon
la verdad quereis que hable;

que el hombre todo es mudable
y variable,
por humanal comprission." (I, 66-7)

Em seu discurso, Cassandra antecipa alguns questionamentos comuns entre homens e mulheres contemporâneos, quais sejam: a dificuldade dos relacionamentos conjugais devida às mudanças das personalidades e a monotonia causada pelo cotidiano; questões que só encontram solução através de mútuas concessões e readaptações constantes, pois, como diria Camões, "mudam-se os tempos, mudam-se as vontades".

Cassandra é, portanto, a mulher que deseja ser livre, "ni casada,/ni monja ni ermitaña" (I, p. 53), e, apesar de desejar a honra de ser a mãe de Jesus, reclama, por outro lado, das dores do parto, não crendo muito que o instinto da maternidade possa fazê-la realizada:

"Allende desso, sudores
y dolores
de partos, llorar de hijos:
no quiero verme en letijos,
por mas que tú me namores." (I, p. 57)

Gil Vicente, pela primeira vez em sua obra, leva-nos a questionar mais profundamente sobre a situação da mulher portuguesa da época. Em 1523, com a Farsa de Inês Pereira, apresentar-nos-ia a antítese de Sibila Cassandra.

Antes disso, Gil Vicente deu-nos duas personagens também importantes para a nossa reflexão: a Mofina Mendes, em 1515, e Isabel, de Quem tem farelos?, também em 1515.

2.2 – Isabel: o conflito de gerações

Isabel, a simpática personagem de Quem tem farelos?, reflete o chamado "conflito de gerações". A moça, ao contrário de Sibila Cassandra, não renega o casamento, mas não deseja casar-se sem antes ter tido o direito de gozar a vida, ser bela e livre, cortejada e coquete. Tão pouco vê o casamento como clausura e obrigações domésticas. Suas idéias são expostas no diálogo que mantém com a mãe no final da peça.

Isabel, objeto do amor cortês de Aires Rosado, um escudeiro falido, é surpreendida pela mãe quando, à noite, este lhe faz a corte debaixo da sua janela, numa das cenas mais cômicas da obra de Gil Vicente. A mãe de Isabel, após rogar dezenas de pragas ao escudeiro que a despertou com o barulho da sua falação, e fazê-lo partir, repreende a filha, dizendo-lhe que a vinda do escudeiro tinha sido obra da pequena, o que a jovem contesta, dizendo não ter culpa e acrescentando:

"Vós quereis que me despeje,
vós quereis que tenha modos,
que pareça bem a todos
e ninguém não me deseje?
Vós quereis que mate a gente,
de fermosa e avisada;
quereis que não fale nada,
nem ninguém em mim atente?
Quereis que creça e que viva,
e não deseje marido;
quereis que reine Cupido,
e que eu seja sempre esquiva.
Quereis que seja discreta,
e que não saiba d’amores;
quereis que sinta primores
mui guardada e mui secreta?" (V, p. 84-5)

A réplica de Isabel fundamenta-se na lógica da sua juventude e graça. Isabel questiona os desejos da mãe, comparando-os com a própria personalidade. Sua lógica é simples e convincente: como quer a mãe que ela seja descontraída, pareça bem a todos e que não seja desejada? Como pode uma moça, cuja a mãe quer culta e inteligente, ser, ao mesmo tempo, ingênua e ignorante em matéria de amor? Como pode uma moça, cuja a mãe quer que escute galanteios e que impressione a todos por sua beleza e por suas maneiras, ficar sempre fechada no lar, "mui guardada e mui secreta"?

Segundo já observou Maria de Lourdes Saraiva, ao se referir à estrofe iniciada por "Tomade-a lá! Hui! Isabel!" logo depois da réplica descrita,

"Toda a fala da Velha é de primorosa observação. A ternura e a admiração pela filha fazem-lhe esquecer a zanga. Mas, ao mesmo tempo, não abdica da posição maternal, tratando-a como uma criança e fazendo reparos que no fundo só traduzem admiração pela cultura e desenvoltura da filha" (6).

De fato, percebe-se tal simpatia, corroborada também pela liberdade com que a filha expõe suas idéias à mãe. Seus desejos são:

"Ir-se a miúde ao espelho,

e poer de branco e vermelho,
e outras coisas que eu sei.
pentear, curar de mi
e poer que seja em direito;
e mover por meu proveito
estes beicinhos assi." (V, p. 86)

Neste trecho, a filha revela seus desejos relacionados à aparência física, deixando claro a sua vaidade feminina. Quer pintar-se, bem pentear-se, tratar de si mesma, corrigir as sobrancelhas, confiando o seu futuro aos segredos do espelho. Pôr-se bela, segundo o desejo dos homens. E, como não houvesse batom na época, morder os lábios "por seu proveito". E ainda:

"Ensinar-me a passear,
pera quando for casada;
não diga que fui criada
em cima de algum tear:
saber sentir um recado,
responder em improviso
e saber fingir um riso
falso e bem dissimulado". (V, p. 86)

Se a estrofe anterior expõe a vaidade da filha em relação aos seus dotes físicos, nesta a vida social está presente e a moça mostra-se coquete e dissimulada, atendendo certamente às exigências do meio em que vive.

É interessante observar que, como em muitas outras passagens da obra de Gil Vicente, as mulheres referem-se ao tear com desdém. O tear e o lavrar:

"Faz a moça mui mal feita,
corcovada, contrafeita,
de feição de meio anel;
e faz muito mal carão,
e mal costume dolhar." (V, p. 86)

De fato, segundo Isabel, a posição que a mulher que costura tem de assumir, deixa-lhe, depois de alguns anos, o corpo curvado. Tratando-se de um trabalho geralmente silencioso e circunspecto, torna, ainda segundo Isabel, a fisionomia feia. O baixar dos olhos em atenção ao que se tem nas mãos faz com que se não olhe nos olhos dos outros, deixando na mulher o costume do olhar tímido e impessoal.

É óbvio que se trata de um exagero; mas a referência é significativa, sobretudo quando se sabe que o fiar era considerado símbolo do trabalho caseiro e governo do lar, gerando o costume de se oferecer às noivas uma roca cheia de linho e fuso. Segundo Maria de Lourdes Saraiva, a quem devemos a informação, a resposta de Isabel guarda um simbolismo, isto é, a recusa de todo um tipo de comportamento e de vida.

Isabel rejeita o trabalho doméstico, considerando o fiar pior que o tecer. Tal como a mulher moderna, busca um trabalho mais satisfatório fora das tarefas domésticas, e questiona:

"Achais outro mais honrado
ofício para eu saber?..." (V, p. 87)

E acrescenta:

"Tecedeira viu alguém
que não fosse buliçosa,
cantadeira, presuntuosa?
E não tem nunca um vintém.
E quando lhe quebra o fio,
Renega coma beleguim." (V, p. 87)

Este discurso de Isabel antecede o pedido final de independência; pedido que, feito há mais de 450 anos, ainda ecoa nos lábios das adolescentes:

"Mãe, deixai-me vós a mim,
vereis como me atavio." (V, p. 87)

Ao pedir que a mãe não se preocupe com ela, pois se sairá bem, Isabel manifesta, ao contrário de muitas mulheres submissas e dependentes, sua crença em si mesma e na capacidade de construir o seu próprio futuro. Entretanto, Gil Vicente termina o diálogo entre a mãe e a filha com uma frase que instaura a possibilidade do fracasso, ou que expõe o mundo ilusório da juventude. E, curiosamente, quem a diz é a própria Isabel, e não sua mãe, deixando-nos entrever uma ponta de ironia. A frase é uma resposta à afirmação da mãe que lhe diz que a fará amassar o pão: "Essa é outra fantasia!", frase que encerra a peça.

2.3 – Mofina Mendes: a arquiteta dos destinos

É controversa a data de encenação do Auto dos mistérios da Virgem, mais conhecido pelo nome de Auto da Mofina Mendes. alguns, como Oscar Lopes e António José Saraiva (6), estabelecem o ano de 1515; outros, como Cleonice Berardinelli (7), aceitam a data de 1510; e Marques Braga (8) o ano de 1534.

Deixando de lado a discussão sobre as datas, o que nos chama de imediato a atenção é o fato da Mofina Mendes, no contexto da peça, ganhar tal projeção que o auto vicentino passou a ser conhecido pelo seu nome.

O intermezzo pastoril que dá nome ao auto sobre a anunciação e o Natal revela, segundo Marques Braga, o conhecimento que Gil Vicente tinha do Calila e Dimna, coleção de fábulas vertidas em latim por João de Capua, em 1270, sob o título de Directorium vitae humanae, e do livro Conde de Lucanor de D. Juan Manuel (1282-1348), que se guardava entre os livros de uso do rei D. Duarte. Segundo Marques Braga, Doña Truhana, do Conde Lucanor, é a nossa Mofina Mendes, cujo nome, "mofina", significa "desgraça" e "mendes", por medes, met ipsen, significa "pessoa", daí "a desgraça em pessoa" (9).

Mas qual seria a função do intermezzo profano em um auto que pretendeu ser "dos Mistérios da Virgem"? Para Antonio José Saraiva e Oscar Lopes, a cena da Mofina Mendes exerce uma função dentro do simbolismo geral da peça, materializado e resumido no pote de azeite que a Mofina, bailando, deixa cair no chão. Acentua, por contraste, a intemporalidade do mundo ideal, representado pela Virgem, pelas virtudes e pelos anjos, cuja linguagem reveste uma solenidade litúrgica, realçada pelo Latim das Escrituras" (10).

Seja qual for a interpretação que se dê à inclusão do episódio, o certo é que a Mofina Mendes destacou-se de tal maneira que, como se diz em linguagem teatral, acabou por ofuscar a atriz principal, roubando-lhe a cena.

Mofina Mendes dá curso a várias representações da mulher como símbolo da desgraça e perdição dos homens, a começar por Eva ou por Lilith, a "lua negra", que teria precedido Eva como a primeira mulher de Adão e por este rejeitada por não ser submissa. Lilith alia-se aos demônios e passa a ser representada como um ser maléfico, seguida por Circe, as Eumênides, as Górgonas e muitas outras em constantes ações contra os homens.

Ainda que a personagem de Gil Vicente não tenha as proporções maléficas dos mitos citados, Mofina Mendes personifica a sorte mofina, simbolizando a influência da mulher para o bem ou para o mal. Assim é vista pelos pastores, entre eles Payo Vaz, para quem Mofina Mendes é a mulher que a todos importuna, como instrumento do demônio. Tudo o que sucedia no mundo, tudo o que acontecia ao seu gado, era obra da Mofina Mendes:

"Ella deu o saco em Roma,
e prendeu elrei de França:
agora anda com Mafona,
e pôs o turco em balança.
Quando cuidei que ella andava
co'o meu gado onde sohia,
pardeos! ella era em Turquia,
e os turcos amofinava,
e a Carlos Cesar servia
Diz que assi resplandecia
neste capitão do ceo
a vontade que trazia,
que o turco esmoreceo,
e a gente que o seguia." (I, p. 143-4)

Como se lê, quando as tropas sob as ordens de Carlos V saquearam Roma, em 1527, ameaçando o Papa Clemente VII, andava ali o dedo da Mofina Mendes, que também teria sido responsável pela prisão do rei de França, Francisco I, por Carlos V, na batalha de Paiva. Mofina Mendes também estaria metida na Síria e no Egito, conquistados pelo Imperador Selim, o inflexível, que reinou de 1512 a 1520 (12).

Mofina Mendes funciona como elemento de projeção, pelo qual Payo Vaz expulsa de si e localiza no outro a responsabilidade dos seus infortúnios. Mas, ao mesmo tempo em que Gil Vicente cria a personagem e esta funciona, entre outras coisas, como elemento de projeção, acrescenta ao seu texto elementos para a defesa de Mofina Mendes e denuncia o preconceito dos homens em relação à personagem, e, por extensão, provoca uma reflexão sobre esses preconceitos, responsáveis pela perseguição a centenas de mulheres acusadas de bruxaria durante a Idade Média.

Logo após o longo trecho em que Mofina Mendes relata a Payo Vaz a perda das cabras, a morte de algumas vacas e a de bois, porcos, vitelas, cabritos e carneiros, ela passa a lhe cobrar o pagamento pelo seu trabalho, obtendo do amo apenas um pote de azeite para vender na feira, o que não correspondia ao valor do seu trabalho, refletindo a exploração da mulher pelo homem.

Mofina Mendes passa então a sonhar, relevando seus desejos inocentes:

"Do que este azeite render
comprarei ovos de pata,
que he cousa mais barata
qu'eu de lá posso trazer.
E estes ovos chocarão;
cada ovo dará um pato,
e cada pato um tostão,
que passará de um milhão
e meio, a vender barato.
casarei rica e honrada
por estes ovos de pata,
e o dia em que for casada
sairei ataviada
com hum brial d’escarlata,
e diante o desposado,
que me estará namorando:
virei de dentro bailando
assi dest’arte bailando,
esta cantiga cantando." (I, 159-50)

Mofina Mendes não assume uma atitude de desagrado em relação ao pagamento que lhe faz Payo Vaz: alguns tostões como se pode deduzir dos versos "cada ovo dará um pato / e cada pato um tostão". Pelo contrário, resigna-se e extrai disso o seu sonho de casar rica e honrada. Mofina, ao cantar, revela traços da sua personalidade: é uma mulher resignada, humilde, sonhadora, pronta para o amor e para o lar, não sendo, portanto, uma pessoa de índole má e personalidade negativa, o que contradiz a atribuição que lhe fazem de azarenta e mofina.

Entretanto, como na fábula, cai-lhe o pote de azeite ao chão, o que faz com que Payo e Pessival reafirmem suas convicções de que Mofina é mesmo "Mofina Mendes toda". Neste ponto, compreendendo que, preconcebidamente, a acusam de todo o mal, vai-se a cantar:

"Por mais que a dita m’engeite,
pastores, não me deis guerra;
que todo o humano deleite,
como o meu pote de azeite,
ha de dar consigo em terra." (I, 151)

A personagem atinge nestes versos a culminância do símbolo; mas é aí que, revertendo o preconceito, Mofina Mendes cresce diante do leitor (ou espectador). Como assinalaram António José Saraiva e Oscar Lopes, "o dramaturgo, num rasgo, salta finalmente da sua risível leviandade à consciência amarga de que, afinal, todos temos o nosso pote de azeite" (11).

2.4 – Rubena: a mulher-dor

Rubena é a mulher-drama da obra de Gil Vicente, sua criação feminina mais profunda e comovente; a mulher tomada a sério e vítima do amor, do preconceito e da rejeição social.

Filha de um abade, um clérigo que servia a seu pai enamorou-se dela. Rubena deixou-se seduzir e engravidou. Por temer a rejeição social e a reação do pai, homem cruel por natureza, de ânimo duro e sem nenhuma moderação, Rubena oculta a sua gravidez com atavios e adornos. Uma noite, ao sentir as dores do parto, chora e se lamenta, numa das passagens mais belas e comoventes de toda a obra vicentina. Um lamento dramático e ao mesmo tempo poético, no qual fala da sua "perdição", do sentimento de solidão que a possui, do seu desamparo; da sua mocidade infeliz, do falso amor enganada. Desejando morrer, compara a sua vida com a de outras donzelas:

"Oh cuanto beditas son
muchas doncellas que vi,
que para su proprio varon
guardaram su perfeccion,
y no la triste de mí!
Benditas y bien libradas
desposadas e casadas,

carona de sus parentes!
ay! que me ciercam puntadas!
mis angustias son llègadas,
y accidentes." (III, p. 6)

Este trecho da lamentação de Rubena reflete, mais do que o seu arrependimento, a ideologia patriarcal e a importância do casamento. Benditas são as donzelas que guardaram a sua perfeição para o bom casamento. Rubena, conforme diz em sua lamentação, sempre fora amada por seu pai, sempre querida por todos, sempre adorada e servida, sempre porto sem tormenta, sempre muito alegre e contente.

Nesse momento, entra em cena Benita, sua criada, de quem pretende ocultar o seu drama, queixando-se de outras dores.

Benita percebe a verdade, mas não demonstra solidariedade, acrescentando que o que ocorria era fruto da personalidade livre e alegre de Rubena:

"Bien vi yo enorabuena
que las risas de Rubena
nesto habian de parar.
Tanto burlar e reir,
y tanto ir y venir
elo ojo al clérigo nuevo,
húbola de bendecir." (III, p. 12)

A solidariedade, que não lhe presta Benita, que ironiza sobre o seu drama, vem com a chegada de uma Parteira que a tranqüiliza. Antes , fala-lhe da condição feminina:

"Somos eira de cangrejos,
ha hi homens tão sobejos,
que, ma trama que lhes nasça,
com enganos, com despejos,
lá buscam ma ora ensejos
pera elles tomarem caça." (III, p. 14)

É interessante observar que a mulher como objeto de caça é uma metáfora constante na obra de Gil Vicente, refletindo a conceituação do amor e da sedução como um esporte praticado pelos homens, e que tem nas palavras da Parteira a sua condenação.

A parteira, para quem, segundo o próprio ofício, certamente o parir é humano e natural, diz-lhe palavras de incentivo e solidariedade:

"Va-se o tempo à meresia,
que o vento ha de soprar;
e não vos ha de lembrar
vergonha nem cortesia.
...............................................
Dae a mão ao pousadeiro,
leixai ir ao escudeiro,
que como o vento he de baxo,
logo a chuva he no terreiro." (III, p. 18)

Segundo a Parteira, o tempo apaga tudo, inclusive a vergonha de Rubena. Ditas estas palavras, diz-lhe que, por temor ao pai de Rubena, irá buscar uma feiticeira que a mandará levar para um lugar seguro, onde poderá realizar o parto. Ao ir-se a Parteira, Rubena continua o seu lamento; agora revelando em seu discurso a noção de pecado. Para Rubena, ter amado e engravidado é desmerecer o paraíso e descer aos infernos, como se Deus punisse alguém pelo amor que vivenciou.

Logo retorna a Parteira com uma Feiticeira que, por meio de esconjurações e feitiços faz vir quatro diabos aos quais ordena que levem Rubena a um lugar seguro. Rubena é conduzida por eles, em um andor, como são conduzidas as santas. Em uma montanha Rubena dá a luz a uma filha, a mais formosa de Espanha: Cismena.

Ao retornarem, os diabos relatam o parto à Feiticeira, a qual lhes ordena irem roubar um berço para a criança. Um berço dourado e muito rico.

Como que denunciado a hipocrisia da época, a mesma que condenara Rubena, algumas sugestões de onde localizar berços referem às casas de amantes de membros do clero.

A um dos diabos, a Feiticeira pede que busque uma ama-de-leite, a qual argüi para verificar se estava qualificada para cuidar da criança, o que não só corroborada a solidariedade feminina, como revela carinho por Rubena e sua filha.

Nesse instante, entram em cena duas fadas que predizem o futuro de Cismena, de início sofrido e choroso, sem amparo, e correndo o risco de ser vendida um dia pela mãe de criação. Predizem também que Cismena será uma grande senhora, muito ditosa, casta e discreta, enriquecida pela herança que receberia, aos quinze anos, de uma mulher cretense.

Cismena é criada nas montanhas e, ao chegar o tempo de realizarem-se algumas das predições, entre elas a venda de Cismena como escrava, retornam as fadas, as quais, alertando Cismena do perigo que corria, recomendam-lhe que vá para Creta. Aceita a recomendação, durante o percurso em direção a Creta, Cismena vai dizendo:

"Oh mãe de filha perdida!
Oh filha de mãe prenhada,
sem ventura!
Alma sem vida nacida!
Filha da morte acordada,
sempre escura! (III, p. 45)

As palavras de Cismena, que antecedem o início da terceira cena, nos remetem ao início da peça, voltando e fechando, como num círculo, as lamentações femininas. Gil Vicente, habilmente, antes de iniciar a parte da peça em que Cismena será a protagonista, reenvia-nos, através das lamentações da filha, às lamentações da mãe, Rubena. Porém, antes de nos concentrarmos na estória de Cismena, voltemos a Rubena.

Rubena, como vimos, é a mulher-dor; é a mulher que não encontra apoio no seio da família; nem na criada, pessoa comum e previsível. Por ver-se deslocada, Rubena encontra em outra deslocada e perseguida de então, uma Feiticeira, a sua maior aliada, além da Parteira, que traz sua filha à vida.

Rubena é, portanto, símbolo da mulher dor, que perde a filha para não sofrer a censura e a rejeição social, mas que encontra na Parteira e na Feiticeira um instrumento e uma verdade: a importância da vida e as determinações do destino.

Cismena, por conhecer as desventuras da mãe, revelar-se-á mais cuidadosa. Mas isso será objeto do que vem a seguir.

2.5 – Cismena: a guardiã da honra

Em suas lamentações de mulher seduzida e abandonada, Rubena refere-se às mulheres que gozam de felicidade:

"Oh cuanto benditas son
muchas doncellas que vi,
que para su proprio varon
guardaron su perfeccion,
y no la triste de mí!
Benditas y bienm libradas
desposadas y casadas,
corona de suas parientes!" (III, p. 6)

Uma dessas donzelas será Cismena, sua filha, que, conhecendo a dramática experiência da mãe, guarda-se para o verdadeiro amor, fundamentado na confiança que vier a ter no pretendente.

O futuro de Cismena já havia sido predito pelas fadas Ledera e Minea quando do seu nascimento: teria uma vida triste no início, sem amparo; sua falsa mãe pretenderá vendê-la um dia, mas Cismena acabará tornando-se uma grande senhora, muito ditosa, formosa, casta e discreta.

Cismena cresce nas montanhas, entre pastores, e, tendo chegado o tempo em que lhe havia de acontecer o que predisseram as fadas, estas a vieram avisar do projeto da sua falsa mãe. Cismena, seguindo as orientações das fadas, vai para Creta, onde encontra uma rica senhora que lhe deixa a sua fortuna em testamento. Lá Cismena encontraria o amor e, aos dezesseis anos se casaria.

O lamento de Cismena, ao final da segunda cena é, segundo já dissemos, a última referência à mãe, Rubena. A lembrança da mãe, sem dúvida, ficará como exemplo a não ser seguido. Nos versos, além de lamentar-se da própria condição, Cismena imagina que, certamente, Rubena teria a mesma dor.

Rica e sozinha, após o cumprimento de parte da profecia, Cismena recebe uma alcoviteira, disfarçada em beata, que a quer casar. Neste ponto, Cismena mostra-se cuidadosa, desinteressada pelos homens e, por conhecer os males que lhe poderão advir, avessa à idéia de ter um marido:

"Não me fio de ninguém;
eu sou minha guardadeira,
que me guardarei mui bem.
Não há mister a donzella
virtuosa, atalaiada,
que olhe por ela;
porque aquella que se vela
tem outra vela escusada." (III, p. 49)

Dito isso, a beata lhe responde: "Filha, enfim ser namorada / he grande galantaria", ao que Cismena replica: "Guarde-me Deus dessa dor", demonstrando a associação que faz entre a idéia de amar e sofrer, resquício do exemplo materno.

Com idas e vindas, argumentos e contra-argumentos, a beata tenta convencê-la. Cismena confessa-lhe então o seu propósito:

"Madre, isto em confissão:
determino de ser freira
que este mundo he todo vão;
e ser freira he salvação
muito certa e verdadeira." (III, p. 53)

Gil Vicente, que em toda a sua obra satirizou as mundaneidades, não poupando os clérigos, sempre evitou criticar as freiras. Em toda a sua obra aparecem apenas duas, Dorosia e Domicília, na Romagem dos agravados. Este é um aspecto curioso, posto que se sabe das referências à imoralidade generalizada dos conventos de freiras da sua época, o que, inclusive, levou o bispo de Ceuta a autorizar, em 1512, uma freira a viver fora do convento, porque os que existiam em suas dioceses eram tais que neles a religiosa perderia a virtude.

As duas freiras de Gil Vicente, Dorasia e Domicília, viviam, por sinal, fora do convento, mas à maneira conventual. A referência de Cismena sobre ser freira demonstra respeito à vida religiosa das mulheres, mas Gil Vicente não deixa de, pelos lábios da alcoviteira, demonstrar um agudo senso da realidade, indicando que, apesar de freira, a mulher tem dificuldade em sublimar o desejo sexual:

"Que também lá ha peleja
da razão com apetito;
a isto não vale igreja." (III, p. 53)

À cena da alcoviteira segue-se a das lavradeiras, que relatam a Cismena o fato de que alguns homens estão perdidos por ela:

"He Felicio discreto
e Dom Castro liberal
e Dario Lebo, desperto,
gracioso perenal,
e músico grande por certo.
Todos três andão perdidos
por vossa Mercê, senhora." (III, p. 60)

Cismena recebe a visita de cada um deles e os rejeita. E por esta cena passaríamos, se não achássemos importante observar a metáfora da mulher como objeto de caça. Essa metáfora é utilizada por Felício e introduzida pelas lavradeiras que cantam.

"Halcon que se atreve
com graça guerrera
pelígros espera.
Halcon que se vuela
con garça à porfia,
caçar la queria
y no la recela:
mas quien no se vela
de graça guerrera
peligros espera." (III, p. 61)

A cantiga aponta a mulher como uma garça a ser caçada, mas adverte o caçador dos perigos que pode encontrar. E Felício parece saber disso:

"Os perigos que eu espero
nesta caça venturosa,
real garça rigorosa,
eu os busco, eu os quero
por seguir, ave fermosa:
e pois voais alterosa,
e tão ligeira,
a vitoria toda he vossa
segura estais na ribeira,
e nas alturas ditosas." (III, p. 61)

A metáfora da caça revela, por parte do homem, uma visão da mulher reificada, presa a ser conquistada pelo mais forte. Isso deixa transparecer a psicologia do homem da época, que vê a mulher como ser mais frágil e que, por isso mesmo, pode ser aprisionada (caçada), vencida pela astúcia e superioridade do homem-caçador, o que pode ser exemplificado por outra metáfora, a do falcão, aplicada ao homem:

"Eu direi isso à fortuna
com palavras de tristura,
que sou falcão sem ventura
e minha garça s’enfuna
sobre a nuvem mais escura." (III, p. 62)

Observe-se também o caráter activo-passivo, implícito na relação caçador-caça, e o conceito, também implícito, da sedução como um esporte, assim como o é o da caça.

Entretanto, as lavradeiras advertem que "halcon cazador / con garça tan fiera / peligros espera", projetando, através da cantiga, o desejo de vitória feminina.

A cena em que Felício aparece permite a catarsis feminina, pois este acaba derrotado pela caça e irá morrer nas montanhas, o que provoca a seguinte reação de Cismena ao receber a notícia:

"Pois morreu em seu ofício,
que culpa temos nós? (III, p. 80)

A reação de Cismena pode ser atribuída ao desejo inconsciente de vingar a mãe, vítima da sedução que a levou à desgraça. É curioso observar que só depois da morte de Felício, o sedutor, Cismena está pronta para amar um homem, como se precisasse primeiro vingar a mãe para poder amar.

O seu objeto de amor será um príncipe que...

"Veio desconhecido a ver a cidade de Creta, e que tanto viu a Cismena, ficou perdido por ella, e determinou de a servir d’amores, e se pôs por page de Felício, assi desconhecido, porque indo om elle a visse. E foi em sua companhia àquelas montanhas onde Felício determinou de acabar seus dias". (III, p. 72)

Trava-se entre Cismena e o Príncipe o seguinte diálogo, que finaliza a peça e nos permite algumas conclusões interessantes:

"Cis. Senhor, eu nisto me fundo:
dou-lhe que sejais Alteza;
não darei minha limpeza
ao maior rei do mundo,
nem por nenhua riqueza.

Princ. Oh qué sobra de firmeza!
Bien merece
vuestra gran bondad nobleza:
pues del todo os guarnece
la soberana grandeza,
quiero que seais princesa
n Siria, y esposa mia,
porque acabe en alegría
la fuerte ventura vuesa,
y el mal que me dolia.
Mas alta, dice Platon,
es la virtude, que el estado;
y a esta obligado
el mundo de darle el don,
y el cetro mas honrado.
Dadme la mono, señora,
por mi esposa y laureola,
pues que sois merecedora
pera ser emperadora,
cunto mas princesa sola.

Cis. Este amor he verdadeiro;
isto si, si que me apraz,
e não amor de sequeiro,
que em fim, por derradeiro,
quanto faz tanto desfaz.

Princ. Quedad, señora, segura,
y estad aparejada

Lav. Senhora, não mais costura;
festejemos tal ventura,
ventura bem empregada." (III, p. 82-3)

A primeira observação que se pode fazer é a da associação que se faz entre sexo e limpeza. Para Cismena, a virgindade, ou o caráter de ser virgem, está estreitamente ligada à idéia de limpeza, de acordo com uma visão católica que tende a associar o sexo não sacramentado à idéia de pecado. Por outro lado, a reação do Príncipe revela o sentimento de determinado tipo de homem em relação à virgindade. A negação de Cismena, e a firmeza que demonstra em manter-se intocável, faz com que o Príncipe a valorize mais ainda, citando Platão que diz ser mais alta a virtude do que o estado, e a pede como esposa e imperatriz.

Cismena reconhece, após o pedido de casamento, que aquele sim é uma amor verdadeiro e aceita o Príncipe. Termina então a peça, num happy end, com a festa que as lavradeiras iniciam.

Cismena serve então como antítese da mãe, que fora infeliz por desafiar as convenções sociais.

A peça quer, num tom didático e moralizante, deixar implícita a idéia da importância da virtude e obediência à moralidade católica como meio de se conquistar a felicidade. Isso nos leva a levantar uma questão: Gil Vicente teria sido, pelo menos nesta peça, um conservador preconceituoso? A resposta nos parece ser "não". O episódio de Rubena é o mais vivo, o mais dramático e ao mesmo tempo lírico da peça. Rubena ganha, inclusive, como personagem, adquirindo uma personalidade dramática que a torna uma das figuras mais singulares de toda a obra vicentina. Claro é que Gil Vicente não se afastou da moralidade do século em que viveu; mas, ao mesmo tempo, também denuncia essa moralidade como fator de infelicidade da mulher, que chega ao ponto de rejeitar o amor e viver conflitos existenciais, como no caso de Cismena, que pensou em recolher-se a um convento por temor aos homens.

2.5 – Inês Pereira: a mulher-mulher

Escrito em 1523, o Auto de Inês Pereira apresenta-nos a mulher-mulher, com um aguçado sentido da realidade, ciência da condição feminina e senso prático da existência, consubstanciado no ditado que encerra a sabedoria da personagem: "mais quero asno que me leve que cavalo que me derrube". No entanto, a sabedoria e a visão pragmática do mundo demonstradas por Inês Pereira são frutos da sua experiência existencial e afetiva.

Inês, logo que entra em cena, queixa-se da sua condição existencial, mas não do fato de ser mulher. Suas primeiras palavras renegam o trabalho doméstico, a clausura do lar e a falta de liberdade:

"Renego deste lavrar
e do primeiro que o usou
.........................
Coitada! Assi hei-destar
encerrada nesta casa
como panela sem asa
que sempre está num lugar?
...........................
Todas folgam e eu não
todas vêm e todas vão
onde querem, senão eu. (V, p. 219-21)

O autor habilmente concentra as queixas de Inês em um universo semântico de palavras restritas aos afazeres domésticos: lavrar e panela; além de casa, esta última como sinônimo de clausura. Mas Inês é a antítese de Sibila Cassandra no que se refere ao casamento. Inês anseia por um marido que a faça feliz. Identifica-se com Isabel que quer gozar a vida e encontra na mãe o elemento de censura e interdição. É assim que, voltando da igreja, a mãe de Inês a repreende por não ter terminado a tarefa de lavrar um travesseiro:

"Olhade ali o mau pesar!
Como quereis tu casar
com fama de preguiçosa?" (V, p. 222)

O discurso da mãe, ao destacar uma qualidade que julga necessária para uma boa esposa, revela a ideologia social da época em relação à mulher, ideologia esta que se estendeu a outras épocas: para um bom casamento, a esposa deveria ser antes de tudo diligente. Como não participava do mercado de trabalho (até porque não havia, a não ser no campo), o valor da mulher estava em ser bonita, doméstica e geradora de filhos. Daí, a fama de preguiçosa ser um inconveniente que certamente reduziria as oportunidades de um bom casamento. Contudo, Inês não demonstra passividade em relação às idéias da mãe, e revela em sua réplica ousada um traço marcante da sua personalidade, isto é, o constante questionamento dos valores sociais e a determinação de alcançar seus objetivos. Segundo Inês, que se diz apressada, a preguiçosa seria a sua mãe, que não se dá pressa em lhe arranjar um marido.

Inês também não se monstra passiva em relação aos homens. Não espera ser escolhida, mas sim escolher:

"Porém, não hei-de casar
senão com homem avisado
ainda que pobre e pelado
seja discreto em falar." (V, p. 228)

Ou ainda:

"mãe, eu me não casarei
senão com homem discreto,
e assi vo-lo prometo
ou antes o leixarei." (V, p. 237)

Aqui, "discrição" tem o sentido que se lhe dava na época. Homem discreto seria aquele que possuísse as virtudes palacianas, ou seja, o saber, a educação, a finura etc.

Noutra passagem, Inês completa sua idealização de marido:

"Que seja homem mal feito
feio, pobre, sem feição
como tiver discrição,
não lhe quero mais proveito.
E saiba tanger viola,
e como eu pão e cebola,
siquer uma cantiguinha
discreto, feito em farinha
porque isto me degola." (V, p. 231)

Como se vê, Inês não está preocupada com dotes físicos ou com a situação financeira do seu futuro marido. Para ela, importante é que, além das virtudes palacianas que ele deverá Ter, saiba tanger viola, desejo manifestado pelo seu lado lírico e ansioso por diversões. Inês parece completar Quem tem farelos?, pois, como se verá, o resultado das fantasias de Inês poderia ser também aplicado à Isabel. A fantasia e a idealização que faz Inês Pereira é própria da psikhé da adolescente e transcende a realidade, o que acabará por decepcioná-la. A mãe assim lhe adverte:

"Pardeus, amiga, essa é ela:
mata o cavalo de sela
e bô é o asno que me leva." (V, p. 231)

As palavras da mãe antecedem as da experiente Lianor Vaz:

"Sempre eu ouvi dizer:
ou seja sapo ou sapinho,
ou marido ou maridinho,
tenha o que houver mister,
este é o certo caminho." (V, p. 231)

Os discursos de Lianor Vaz e da mãe de Inês, por guardarem a sabedoria popular própria dos ditados, servem para mostrar a importância do casamento como meio de segurança da mulher, estabilidade e manutenção da moralidade. Por conseguinte, qualquer homem que tivesse condições de sustentar um lar serviria.

A mãe pretende para Inês uma homem abastado, e assim lhe parece Pêro Marques, dono de terras e gado, mas que é rejeitado por Inês por não ser discreto e inteligente.

Inês critica-lhe inclusive o caráter de homem cumpridor, pois o camponês respeitava os valores de uma ordem que Inês já não compreendia. Vendo-se só com a moça, Pêro Marques achou melhor ir-se para não macular a reputação da jovem. Inês, sem que ele perceba, pensa alto:

"Quão desviado este está!
todos andam por caçar
suas damas saem casar,

e este, tomade-o lá!" (V, p. 235)

Pêro Marques é, segundo Lianor, "um bom marido, rico, honrado, conhecido" que "em camisa", isto é, sem dote e pobre, aceitaria Inês Pereira. Ao ver-se rejeitado, humildemente diz-lhe que não mais a incomodará e parte.

Inês acaba casando-se com um escudeiro sem posses, mas que teoricamente, satisfazia todas as suas exigências, pois sabia ler, escrever e era bom no jogar a bola e no tanger a viola. Contudo, logo após o ritual do casamento, o escudeiro já demonstra a sua contrariedade:

"Esc. Oh! quem me fora solteiro!
Inês Já vós vos arrependeis?
Esc. Ó esposa não faleis,
que casar é cativeiro." (V, p. 253)

Ditas estas palavras, vem a mãe com algumas moças e moços para fazer uma festa. Abençoa a filha e lhe deixa como dote a casa. Então tem início a triste experiência de Inês; seus ideais começam a cair por terra logo que Inês, alegre, põe-se a cantar, no que é repreendida pelo marido. Segue-se todo um discurso sobre as restrições impostas pelo escudeiro, do qual transcrevemos um pequeno trecho:

"Será bem que vos caleis,
e mais sereis avisada
que não me respondais nada,
em que ponha fogo em tudo
porque o homem sesudo
traz a mulher sopeada.
Vós não haveis de falar
com homem, nem mulher seja;
somente ir à igreja
não vos quero eu leixar.
Já vos preguei as janelas,
porque não vos ponhais nelas,
estarei aqui encerrada
nesta casa tão fechada
como freira d’Oudivelas." (V, p. 255)

Inês encontra no marido o repressor, mas, segundo ele mesmo diz, não buscava ela discrição?

A partida do escudeiro, que desejava fazer-se cavaleiro na África, é a salvação de Inês. Renegando a discrição, retira disso uma experiência para toda a vida.

O marido morre quando, segundo uma carta que lhe enviam, fugia da batalha para a vila e o matou um mouro pastor. Gil Vicente, neste ponto, faz um escárnio sobre o escudeiro que em casa dava ordens, mas que fora dela revela-se apenas um valentão covarde, que nada tem de herói.

Contente com a morte do marido, Inês casa-se com Pêro Marques, logo arquitetando traí-lo com outro homem e aproveita-se da sua personalidade fraca para explorá-lo em todos os sentidos.

Contudo, da decepção com o casamento e a perda das fantasias, surge uma nova Inês, mulher de tal força e tal experiência que, quando encontra Pêro Marques, faz deste tudo, até juiz, o Juiz da Beira, farsa escrita por Gil Vicente em 1525. Nesta farsa temos o depoimento de Pêro Marques:

"minha hóspeda Inês Pereira
(Deus a benza!) sabe ler,
e quanto me faz mister
pera eu ir pola carreira.
De que eu contente sam,
soma avonda que assi
lê-me ela o caderno ali
onde s'é ordenaçam
de cabo a rabo em par de mi
do que pertenço ao juiz:
e assi como ela diz
assi xe-mo faço eu;
e em terra de Viseu
ninguém não me contradiz. (V, p. 275)

Pêro Marques é o magistrado, mas quem lhe dita as leis, quem lê a Ordenação é Inês Pereira, advogada e juíza, confidente e incentivadora, a força de um homem, o juiz da Beira, provando que ao lado de um grande homem, há sempre uma grande mulher. Talvez por isso, Gil Vicente se tenha cercado delas e casado duas vezes.

3 – CONCLUSÃO

As figuras femininas aqui apresentadas de modo algum esgotam o elenco de Gil Vicente, nem foi esse o nosso objetivo, porque senão acabaríamos passando do ensaio para tese, o que cremos ser um bom tema para os estudiosos da literatura portuguesa. Tão pouco julgamos ter aprofundado suficientemente o estudo de cada uma delas.

Gil Vicente retratou bem a situação da mulher portuguesa da sua época e, infelizmente, não cremos que em mais de 400 anos esta situação tenha mudado radicalmente. Ainda hoje, nas cidades ao norte de Portugal, vêem-se mulheres vestidas de luto, a indicarem que o marido partiu para outras terras, como aquela do Auto da Índia que dispensou a roupa negra e preferiu alegrar-se.

Sibila Cassandra, como vimos, opta por ser livre, revelando temor ao casamento, quase sempre não compensador, pelo menos em sua época. Por ela, Gil Vicente começa a denunciar o amor cortês e a mudança de personalidade do homem casado, antecipando também alguns questionamentos que permanecem vivos até hoje entre os casais casados.

Isabel, ainda que não negue o casamento, pretende viver a sua juventude antes de entregar-se à vida doméstica, e não quer o casamento que seja prisão, trabalho e submissão ao marido. Cria suas fantasias de ilusões que terão em Inês Pereira a visão do fracasso, diante da realidade da vida.

Mofina Mendes surge, entre as mulheres da obra de Gil Vicente, como que por acaso, colocada ali como um intermezzo no Auto dos mistérios da Virgem. Sendo mais real e concreta, rouba-lhe a cena porque, além de denunciar o preconceito humano, dá-nos uma lição de vida ao reapresentar-nos a fábula do pote que se quebra deitando por terra os nossos sonhos.

Rubena. Rubena, nome bom de ser repetido porque é talvez a mais pungente criação do dramaturgo. A mulher-dor, a mulher real, vítima dos preconceitos sociais, do amor fugidio e, ao mesmo tempo, revelador da solidariedade e força feminina. Rubena, a mulher amedrontada, amargurada, mas vitoriosa, cuja vida deslocada encontra um caminho florido através da filha Cismena.

Finalmente, Inês Pereira, ou a Isabel crescida, a mulher-mulher que aprende com a vida e cresce o suficiente para fazer ascender feliz um homem, o Juiz da Beira.


4 – NOTAS

1. BRAGA, Marques. "Gil Vicente" IN VICENTE, Gil. Obras completas. (Pref. e notas de M. Braga), v. I, 5. ed., Lisboa, Sá da Costa, 1974, 6 vols., p. LXVII.

2. VICENTE, Gil. Ob. cit., v. 5, p. 94. De aqui em diante referimo-nos, no texto, apenas ao número do volume e da página.

3. SARAIVA, Maria de Lourdes. IN VICENTE, Gil. Sátiras sociais. (Org. e notas de M. L. Saraiva), Mira-Sintra, Europa-América, 1975, p. 46.

4. MILLER, Neil. O elemento pastorial no teatro de Gil Vicente. Porto, Inova, 1970, p. 85.

5. SARAIVA, Antonio José. História da cultura em Portugal. Lisboa, Jornal do Foro, 1955, v. II, p. 304. le es defunda" (I, p. 66). Para Cassandra...

6. Ob. cit. p. 78.

7. Ob. cit., p. 193.

8. BERARDINELLI, Cleonice. Antologia do teatro de Gil Vicente. (Intr. e est. crit.). 3º ed. Rio de Janeiro, Nova Fronteira; Brasília, INL, 1984, p. 17.

9. Ob. cit., vol. I, p. 127.

10. Idem, p. 141-2.

11. Ob. cit., p. 213.

12. Considerando as referências históricas, e a menos que estejamos enganados, estas deitam luz à data provável da composição do auto. Parece-nos que a mais provável é a estabelecida por Marques Braga. Gil Vicente cita o saque de Roma , ocorrido em 1527. Portanto, não poderia ter escrito em 1510.


5 – BIBLIOGRAFIA

BERARDINELLI, Cleonice, Antologia do teatro de Gil Vicente. (Intr. e est. crit.), 3.ª ed. Rio de Janeiro, Nova Fronteira; Brasília, INL, 1984.

LAFER, Celso, Gil Vicente e Camões: dois estudos sobre a literatura portuguesa no século XVI. São Paulo, Ática, 1978. (col. Ensaios n.º 50).

MILLER, Neil, O elemento pastoril no teatro de Gil Vicente. Porto, Nova, 1970.

SARAIVA, António José, Gil Vicente e o fim do teatro medieval. 3.ª ed. Mira-Sintra, Europa-América, 1970.

SARAIVA, António José, História da cultura em Portugal. Lisboa, Jornal do Foro, v. 1955.

SARAIVA, António José; LOPES, Óscar, História da literatura portuguesa. 11.ª ed. Porto, Porto Editora, 1979.

VICENTE, Gil, Obras completas. (Pref. e notas de Marques Braga) 5º ed. Lisboa, Sá da Costa, 1974, 6 vols.

VICENTE, Gil, Sátiras sociais. (Org. e notas de Maria de Lourdes Saraiva) Mira-Sintra, Europa-América, 1975.

João Domingues Maia, 1993. Texto publicado em Flores Verbais / Jürgen Heye, org. – Rio de Janeiro; Ed. 34, 1995, pp. 335-61.

Voltar à página inicial dos Ensaios

Colaboradores | Coordenação | Contactos | © 1997-2015 Letras & Letras