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Notas de apresentação


Mitologia Geral de Maria Lamas

O mythos é um discurso tão antigo quanto o Homem. Juntamente com o logos, constitui uma forma de compreensão do mundo. Os deuses e os heróis mitológicos são indissociáveis da cultura humana em todas as civilizações e em todas as épocas da História. Do ponto de vista antropológico e artístico-literário, a mitologia é um riquíssimo tesouro de lendas, rituais e explicações, demonstrativos do esforço e inquietação para compreender a Natureza e os seus intrigantes fenómenos, a divindade e os seus mistérios, enfim, os problemas gerais da própria humanidade.

Editada originalmente em 1961, a sua autora, a jornalista, escritora e activista Maria Lamas (1893-1983) propõe-nos uma informativa e cativante obra de divulgação sobre as várias mitologias, desde os povos primitivos, às mitologias europeias, orientais ou greco-romana. Sem paralelo no panorama editorial português, esta louvável obra de divulgação é constituída por dois volumes bem apresentados, amplamente ilustrados, enriquecidos por dois úteis índices remissivos.

Na Mensagem, Fernando Pessoa escreveu: "O mito é o nada que é tudo". A mitologia é absolutamente essencial para a compreensão artística, da música, da escultura, da pintura e da literatura de todos os tempos. Com esta interessante Mitologia Geral, cuja 4ª edição é, por si só, um facto revelador do seu valor, Maria Lamas propõe-nos uma formativa viagem sobre as várias mitologias, sendo por isso recomendável sobretudo a alunos e professores, mas também a todos os que procuram uma cultura alargada, assente nas suas matrizes ancestrais.

Cândido Martins

Maria Lamas: Mitologia Geral, 2 vols., 4ª ed., Lisboa, Editorial Estampa, 2000.


Mitologia Clássica (Guia Ilustrado) de A. R. Hope Moncrieff

Os países anglófonos dispõem, reconhecidamente, de dois segmentos editoriais imprescindíveis a uma boa formação humanística e cultural. Têm uma invejável tradição de riquíssimas edições de obras dos autores clássicos gregos e latinos, em traduções bilingues, profusamente anotadas. São ainda detentores de uma tradição de manuais e guias mais ou menos didácticos, de grande ou mesmo irrepreensível qualidade científica e pedagógica.

O polígrafo autor desta versão aligeirada de Classic Myth and Legend, A. R. Hope Moncrieff (1846-1927), distinguiu-se em obras de divulgação. Com mais de duas centenas de belíssimas ilustrações, este Guia da Mitologia Clássica é uma excelente introdução ao estudo dos grandes mitos, aquelas narrativas alegóricas, fantásticas e intemporais com que o Homem pretendia explicar o mundo que o cercava. São precisamente estes mitos que influenciaram profundamente toda a criação artística ocidental, desde os clássicos gregos e latinos, como Homero ou Ovídio, até às vanguardas e autores contemporâneos.

Pelo seu indiscutível interesse pedagógico, pela oportuna e doseada informação criteriosamente apresentada, pelo agradável estilo do autor, pela apurada qualidade das imagens que enriquecem e a tornam sedutora, esta bela edição da Mitologia Clássica (Guia Ilustrado) deveria constar na biblioteca familiar de todas as pessoas que pretendem uma sólida cultura geral, enriquecida das suas lendárias raízes greco-romanas, tal como nas bibliotecas de todas as escolas, a fim de proporcionar a professores e alunos uma introdução adequada e sedutora.

Cândido Martins

A. R. Hope Moncrieff: Mitologia Clássica (Guia Ilustrado), 2ª ed., Lisboa, Editorial Estampa / Círculo de Leitores, 1997.


Obras Completas, vol. VI, de Filinto Elísio

Com regularidade sempre louvável, apareceu mais um volume das Obras Completas de Filinto Elísio (1734-1819), dos 11 tomos da edição parisiense de 1817-19. Tal como os anteriores, também este conta com uma oportuna introdução do editor, Fernando Moreira, docente na UTAD (Vila Real), enquanto se aguarda a publicação dos estudos que este investigador dedicou ao polígrafo poeta setecentista.

Estruturado em quatro livros, este volume de Francisco Manuel do Nascimento é inteiramente consagrado à fábula, um subgénero poético de cultivo multissecular. E é bem revelador das capacidades do estilo vernáculo de Filinto Elísio, que aqui se aventura a traduzir as escolhidas quase duas centenas e meia de Fábulas de La Fontaine. O neoclássico português reconhece a dificuldade da tarefa — traduzir "com o mesmo pico" e estilo alusivo do original —, mas o resultado é ainda hoje apreciável, nomeadamente pela salvaguarda do estilo alegórico original. Esta é uma das muitas traduções de Filinto, algumas das quais foram já publicadas em volumes anteriores destas Obras Completas.

Além de cabal demonstração dos seus dotes poéticos e linguísticos, esta tradução era também na vida difícil do exilado parisiense uma forma de sobrevivência. Tal como os anteriores volumes, também neste deparamos com as profusas e curiosas notas do culto poeta do grupo da Ribeira das Naus. Ressalta uma vez mais a omnipresente intenção de Filinto em preservar a pureza da língua pátria diante das corruptoras influências estrangeiras, particularmente através da moda do classicismo e enciclopedismo franceses.

Cândido Martins

Filinto Elísio: Obras Completas, vol. VI, Braga, Edições APPACDM, Col. Obras Clássicas da Literatura Portuguesa – Século XVIII, 2000. Edição de Fernando Moreira.


Obras Completas de Domingos dos Reis Quita

Domingos dos Reis Quita (1728-1770) é hoje um dos muitos esquecidos poetas arcádicos da Literatura portuguesa. De origem humilde, enquanto trabalhava como cabeleireiro, dedicou-se autodidacticamente à leitura de poesia, sobretudo de tradição lírica e pastoril. Foi amigo de Correia Garção e de Cruz e Silva, sendo um dos primeiros poetas, sob o pseudónimo de Alcino Micénico, a integrar a Arcádia Lusitana criada logo a seguir ao terramoto. Em 1766, publicou as suas Obras Poéticas em 2 vols., vindo a morrer tuberculoso pouco depois.

Para contrariar o esquecimento e os injustos lugares-comuns a que tem sido votada a literatura arcádica da segunda metade do séc. XVIII, Ana Cristina Fontes organizou uma oportuna edição das Obras Completas de Quita, em dois volumes, segundo a edição (póstuma) de 1781. Para esse efeito, efectuou também o confronto dessa edição de referência com os Manuscritos existentes na Biblioteca Geral da Univ. de Coimbra e com cópias autografadas, além de outras edições. Ana Cristina Fontes modernizou o português setecentista de Quita e enriqueceu a sua louvável edição de duas oportunas introduções iniciais, de algumas justificadas notas de rodapé e de uma criteriosa bibliografia final.

O primeiro volume é composto pela poesia lírica (éclogas, idílios, odes, sonetos, entre outros géneros). Não faltam ainda o "Epítome da Vida de Domingos dos Reis Quita", de Miguel Tibério Pedegache Brandão Ivo; a conhecida "Carta sobre a Utilidade da Poesia" do próprio Quita; um soneto de Nicolau Tolentino, uma das várias composições em que a profissão de Quita se transformou em motivo para a sátira de alguns contemporâneos; ou ainda alguns textos epidíticos. Integram o segundo volume as quatro tragédias escritas por Quita: Mégara, Hermíone, Astarto e Castro. Numa época em que vários autores (desde o infeliz Garção ao polígrafo Manuel de Figueiredo) procuravam restaurar o teatro português, o nome de Quita tem um lugar assinalável, sobretudo pela sua reescrita do drama de Inês de Castro.

Cândido Martins

Domingos dos Reis Quita: Obras Completas, 2 vols., Porto, Campo das Letras, (Col. Obras Clássicas da Literatura Portuguesa – Século XVIII), 2000. Edição de Ana Cristina Fontes.


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