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Notas de apresentação



Longitude, de Dava Sovel

Estamos perante uma bela narrativa que habilmente conjuga traços de romance policial, enredos de intriga palaciana com uma parcela da história da ciência setecentista. O longo subtítulo ajuda a esclarecer: "A verdadeira história de um génio solitário que resolveu o maior problema científico do seu tempo". De facto, um dos grandes enigmas da ciência europeia até ao séc. XVIII era o "problema da longitude", que desafiava a perícia dos destemidos lobos-do-mar e dos mais engenhosos cientistas e astrónomos. A impossibilidade da sua exacta medição era causa de inúmeros acidentes e naufrágios no mar, como o da noite de 22 de Outubro de 1707.

Em 1714, o Parlamento britânico promulgou uma lei e instituiu um prémio encorajador para quem descobrisse a forma de determinar o meridiano da longitude. Deve-se ao relojoeiro inglês John Harrison a invenção de um mecanismo que resolvia o problema. Sem formação académica e à margem da elite científica do seu tempo (sobretudo do astrónomo real Nevil Maskelyne), este homem simples dedicou uma vida à criação de um relógio do mar, vindo a ser reconhecido por Jorge III.

Longitude é, assim, a interessante história dos trabalhos que levaram a uma importante descoberta científica, mas também da batalha contra as ambições e as invejas que ela implicou, ao longo de cerca de quatro décadas. Dava Sovel foi editora de ciência no New York Times, é autora premiada de outras obras. E este seu romance sobre ciência, com referências a Lisboa (viagem de 1737) e a navegadores portugueses, foi bem recebido pela crítica e transformado pelo público num verdadeiro best-seller.

Cândido Martins

Dava Sovel, Longitude, Lisboa, Temas e Debates, 2000 (154 págs; col. Verdade/Ficção; trad. de Ediouro, S.A.).


Viagens na Minha Era, de Onésimo Teotónio Almeida

Este ilustre e multifacetado açoriano está radicado há vinte e cinco anos nos E.U.A. (Providence, Rhode Island), onde dirige o Departamento de Estudos Portugueses e Brasileiros da Brown University. É autor de um apreciável conjunto de obras, distribuídas por vários géneros (crónica, teatro, narrativa, ensaio). Além de lermos os seus livros, temos o enorme prazer de ler as suas crónicas e até de o ouvir, já que se trata de um conferencista extremamente viajado, constantemente requisitado.

Neste delicioso livro, Onésimo T. Almeida recolhe um conjunto considerável de dia-crónicas, cujos contornos do género são traçados prefacialmente pelo autor. Perfazem um conjunto cerca de seis dezenas e meia de textos, anteriormente publicados no Jornal de Letras e na revista Ler. No actual panorama das letras portuguesas, não é fácil encontrar quem escreva este tipo de narrativas breves, construídas a partir de lances quotidianos, com inexcedível humor e cultura.

Digam o que disserem, é uma verdadeira arte a escolha de determinado título, a captação de certo flagrante, a inesperada associação a uma frase espirituosa, a citação de um brilhante paradoxo ou a introdução de uma refinada tirada irónica. E tudo com uma invejável naturalidade, longe daquela enfadonha erudição dos que parecem andar sempre com uma biblioteca de fichas às costas. Os ambientes recriados, o estilo observador e irónico, a graça oportuna e impagável, levam-nos a associar Onésimo, na nossa estante, aos melhores textos de Umberto Eco, David Lodge ou Miguel Esteves Cardoso.

Por tudo isto e muito mais, são textos escrevividos e inesquecíveis, construídos através de uma observação incomparável, de uma escrita ágil e de uma memória arguta. Textos que lemos reconfortada e gulosamente sozinhos, mas depois não resistimos a ler para outras pessoas. O gozo da partilha redobra o prazer inicial. Se o riso tem um comprovado poder terapêutico, então a leitura deste notável livro de crónicas de Onésimo T. Almeida vale por umas férias divertidas e repousantes! Depois de ler Onésimo, temos vontade de exclamar, como J. L. Borges: "Que outros se gabem das páginas que escreveram: eu orgulho-me das que li".

Cândido Martins

Onésimo Teotónio Almeida, Viagens na Minha Era (Dia-Crónicas), Lisboa, Temas e Debates, 2001 (196 págs.).


Cibercultura, de Pierre Levy

A investigação, a cultura e a vida social contemporâneas de finais do séc. XX foram sendo definitivamente transformadas pela influência do ciberespaço. No início do novo milénio, agora iniciado, o profundo impacto das novas tecnologias, com as suas redes digitais e processos de comunicação, vai moldando novas concepções de saber, configurando novos hábitos de trabalho interactivo, e transformando o mundo numa verdadeira aldeia global.

Este actualíssimo e optimista livro de Pierre Levy foi originalmente apresentado como "Relatório para o Conselho da Europa no quadro do projecto Novas Tecnologias: cooperação cultural e comunicação". O seu autor é um apreciado professor e investigador da Universidade do Quebeque, de quem o Instituto Piaget já publicou algumas obras. Obra interessantíssima, muito bem estruturada e, sobretudo, centrada num dos mais actualíssimos temas da nova cultura multimédia do era do homo digitalis.

Cândido Martins

Pierre Levy, Cibercultura, Lisboa, Instituto Piaget, 2000 (281 págs; col. Epistemologia e Sociedade, 138; trad. de José Dias Ferreira).


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