Letras & Letras

Notas de apresentação


Fim de Milénio (VII e VIII Fóruns Camonianos)

A obra de um autor clássico como Luís de Camões continua a desafiar os leitores e os críticos de todas as épocas que, auxiliados pelo progresso dos Estudos Literários, vão desbravando nos caminhos hermenêuticos, apresentando novas propostas de abordagem dos vários géneros cultivados pelo Poeta ou confirmando problemas irresolúveis, como o do estabelecimento do cânone camoniano.

Definitivamente, a Camonologia continua ainda hoje a ser um dos domínios mais complexos, mas ao mesmo tempo mais sedutores da História da Literatura Portuguesa. Uma prova disso está na enormíssima bibliografia camoniana, publicada quotidianamente um pouco por todo o mundo. Outro exemplo é o da frequente realização de fóruns, colóquios, congressos sobre a obra camoniana, como aquele que é empreendido pela meritória Associação da Casa-Memória de Camões em Constância.

Como indicado no subtítulo, é uma interessante e oportuna recolha das participações de vários investigadores em dois fóruns camonianos, realizados na bela vila de Constância nos anos de 1999 e 2000, num total de treze comunicações, distribuídas pelos dois temas escolhidos para essas duas reuniões científicas: “Mudam-se os tempos, Mudam-se as vontades” e “O que se Fez e não Fez nos Estudos Camonianos no Século que Finda”. Cumpre ainda observar que esta publicação surge na sequência de anteriores edições, como a intitulada Épica. Épicas. Épica Camoniana (Cosmos, 1997), também ela coligindo as comunicações de vários investigadores e camonólogos sobre o referido tema, escolhido para o IV Fórum Camoniano (1996); ou Os Mares de Camões (Colibri, 2000).

Entre os participantes, alguns reincidentes, contam-se os nomes de: Amélia Pinto Pais, Margarida Garcez Ventura, Manuela Mendonça, Maria de Fátima Sousa e Silva, Landeg Ernst White, Justino Mendes de Almeida, J. Cândido Martins, José Leon Machado, Rafael Gomes Filipe e Maria Adelina Amorim. Entre os trabalhos apresentados, merecem realce os que apresentam renovados contributos para o estudo de temáticas centrais na obra camoniana, como os temas da mudança ou da herança clássica; ou ainda aqueles que fazem o balanço dos estudos camonianos ou os que aponto para novos caminhos de investigação.

Cândido Martins

Manuela Azevedo (coord.), Fim de Milénio (VII e VIII Fóruns Camonianos), Lisboa, Edições Colibri / Centro Internacional de Estudos Camonianos da Associação da Casa-Memória de Camões em Constância, 2001 (197 págs.).


Obras Completas de Domingos dos Reis Quita - vol. II

Ana Cristina Fortes apresenta-nos, em dois volumes, a obra literária de Domingos dos Reis Quita (1728-1770), na edição mais completa até hoje realizada. Retoma a 2ª ed. edição das Obras do poeta, feita em 1781, em dois volumes, considerada a mais completa. No entanto, a publicação das suas obras já tinha ocorrido em 1766, ainda em vida do poeta, com reedição romântica em 1831, com o defeito de ser mais incompleta que a precedente. A organizadora da presente reedição decidiu, justificadamente, alterar a ordenação dos textos, agrupando-os segundo critérios de género.

No vol. I destas Obras Completas, o leitor depara-se com o “Prólogo do Editor” (da edição de 1781), seguido do “Epítome da Vida de Domingos dos Reis Quita”, da autoria de Miguel Tibério Pedegache Brandão Ivo, e ainda a “Carta sobre a Utilidade da Poesia escrita ao Autor por um seu amigo”. Só então o leitor pode apreciar alguns dos vários géneros cultivados por este esquecido poeta lírico: Écloga, Idílio, Ode, Elegia, Canção, Epístola, Epitalâmio, Hino Devoto, Silva, Sonetos, Drama Pastoril (Licore). Por sua vez, o vol. II é preenchido por quatro textos dramáticos, mais concretamente as tragédias Astarto, Mégara, Hermíone e Castro.

Ao texto base de 1781, esta edição de Ana Cristina Fortes acrescenta, no vol. I, dois sonetos inéditos e três hinos devotos (já indicados por Inocêncio), o que constitui um dos méritos desta edição. Outras das qualidades deste trabalho reside na consulta de manuscritos, de cópias autografadas ou de textos impressos antes da 1ª edição; na introdução de oportunas notas de rodapé, ora confrontando as várias edições, ora apresentando interessantes anotações histórico-críticas. Naturalmente, mostra-se ainda imprescindível o breve, mas adequado texto da “Introdução” sobre a época e o significado estético da obra de Quita.

Com o pseudónimo Alcino Micénio, integrou o movimento arcádico da segunda metade de Setecentos a Arcádia Lusitana ou Olissiponense. Quita era cabeleireiro de profissão, e poeta autodidacta. Curiosamente, os estudiosos do séc. XVIII demonstram-nos que não era assim tão rara esta associação do poeta-cabeleireiro, por vezes alvo de uma escrita satírica. No vol. I, Ana Cristina Fortes transcreve um oportuno poema de Nicolau Tolentino, “Aconselhando um cabeleireiro, que não continuasse a fazer versos”. A sátira e a polémica constituíram procedimentos típicos da cultura arcádica.

Quita foi um poeta popular no seu tempo, merecendo o mecenatismo de alguns aristocratas e a amizade de Correia Garção ou António Dinis da Cruz e Silva. Uma das características da poesia lírica de Quita é a presença visível ou implícita dos clássicos, de Bernardim Ribeiro a Rodrigues Lobo, de António Ferreira a Luís de Camões. Um dos géneros ais cultivados da sua escrita é uma poesia pastoril e bucólica.

É com edições como esta que através de um cuidadoso trabalho de investigação e de cuidadosas reedições, caminhamos para um conhecimento mais facilitado e, ao mesmo tempo, mais rigoroso da criação literária do arcadismo setecentista.

Cândido Martins

Domingos dos Reis Quita, Obras Completas, vol. II, Porto, Campo das Letras, 1999; ed. de Ana Cristina Fontes (389 págs.).


Voltar à página inicial das Notas de Apresentação

Colaboradores | Coordenação | Contactos | © 1997-2015 Letras & Letras