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Notas de apresentação


A Comunicação Estratégica, de José Esteves Rei

«A condução das massas, de pequenas comunidades ou de simples grupos de pessoas – a psicagogia, como a designava Platão – sempre esteve, historicamente, nas mãos de grandes comunicadores, que colocavam o seu domínio ao serviço de ideais vários: religiosos ou militares, sociais ou políticos, económicos ou desportivos. [...] Todas elas recorriam a um tipo de comunicação que hoje denominamos comunicação estratégica.

A evolução recente da sociedade portuguesa e das suas instituições, organizações e empresas, não podia deixar de se traduzir em novas solicitações comunicacionais. Estas tomam uma dupla configuração: a concreta, correspondendo aos modos de produzir actos de fala, orais ou escritos, e circulando no tecido social, empresarial, organizacional e institucional, e a teórica, assentando na reflexão sobre as produções anteriores e Localizando-se nos curricula académicos e na investigação levada a efeito nas escolas superiores de comunicação e nas universidades.» (Da Introdução)

José Esteves Rei, A Comunicação Estratégica, Porto, Ed. Estratégias Criativas, 2002 (Ensaio).


Dicionário de Nomes Próprios, de Orlando Neves

Para os Egípcios, o homem era «corpo, alma e nome», sendo este considerado «uma coisa viva» que identificava, singularmente, todos os seres humanos. Embora já diluída no tempo, esta acepção subjaz, quase inconscientemente, na escolha do nome a dar à criança recém-nascida. Daí que seja compreensível o interesse generalizado em se conhecer a origem e o significado dos nomes, como se eles fossem ainda um presságio do destino desejado ao nomeado. Cerca de três mil nomes masculinos e femininos são explicados – até onde foi possível – neste dicionário, pretendendo ser a maior recolha do género publicada em Portugal, exclusivamente dedicada aos nomes próprios.

Orlando Neves, Dicionário de Nomes Próprios, Lisboa, Editorial Notícias, 2002.


Maçãs de Adão, de António Pedro

«Só não era assim com Rodrigo, um herói louro acima dos próprios deuses que decerto o idolatrariam se o conhecessem, uma alma livre como o mar e o vento de que era feita, a coisa mais bela e mais viril que um homem podia alguma vez ter... E António tinha trocado tudo isso por uma estabilidade que o asfixiava, que só lhe dava algum gozo se conseguisse ter as duas coisas ao mesmo tempo. Ainda se lembrava daquele dia em que tinham ido a uma festa, a rigor, Rodrigo de fato e t-shirt, sem gravata, sapatos de colégio sem meias, a barba de dois dias a dourar-lhe o rosto macio como o de uma criança. As mulheres loucas, os homens verdes de inveja e Rodrigo a deitar fora os trunfos que para nada lhe serviam, a não jogar:

– Sou gay, claro, não se vê logo?

– Estás a brincar, que desperdício!

– Não estou.

– Não gostas de mulheres, mesmo nada?

– Gosto, algumas são muito boas pessoas, e gosto de ver um corpo belo porque a beleza não tem nada a ver com isso, aliás quando quero um homem não é pela beleza, é por ele todo, já tenho tido namorados mesmo muito feios... Quer dizer, as pessoas acham, mas eu acho-os belos de outra forma, pelo menos enquanto estou com eles...

António não era um homem feio. Moreno, mais alto que a média e sem barriga apesar dos seus trinta e quatro anos e da má vida, cabelos escuros e olhos verdes, uma pele azeitonada e doce, sem grão nem imperfeições, cultura acima da média e uma mais que confortável conta bancária, para além de outros atributos que o tinham qualificado perante o sexo oposto – não pela dimensão, como se possa pensar, mas pela sedução de uma perfeição objectiva, nas proporções e no desempenho. Os homens tinham confirmado essa perfeição e um dos seus pesadelos eram aqueles que não aceitavam perdê-lo, por um ou outro motivo ou por todos eles, situações embaraçosas e ameaças de suicídio, cenas na noite e telefonemas todo o dia... Só Rodrigo não.»

António Pedro, Maçãs de Adão, Porto, Campo das Letras; 2002, p. 10 (Ficção).


New England, de Silva Carvalho

«Não interessa saber em que escaninho da língua / o que passa por realidade é a realidade, importa / apenas descobrir no que se pensa e sente a porta / para um mundo melhor onde o sofrimento não / seja mais possível. Estranha afirmação, a frase / parece flutuar no ar, na realidade ficou inscrita / na luz da tela como uma necessidade abstrusa. / Que relação, depois de tudo, com a linguagem / de hoje, com a inoperância do mundo moderno? / Uma estranha transformação liga quem escreve / ao que escreve, escrito quem se deixa de ser?, lido / quem se é do que se deixou dizer? Um abandono / perde-se sem nomenclatura nem predisposição, / haverá algures, na tessitura do mundo, / um mundo capaz de conter a presença do que insistentemente / se altera, passa, desliza em confrontações da hora? / Ignora-se. Aliás, o que é do mundo para se poder / dizer tal palavra, tal obscenidade contemplativa? / A linguagem deplora. Se fosse ao menos possível / suspendê-la por um momento num êxtase ignóbil, / mas não, ela passa e quando passa faz de conta / que conta uma história sem que haja alternativa. / Nenhuma narrativa conseguirá dar do presente / a sua memória, por que se tenta então a escrita? / Há uma criança brincando com a demora, de onde / veio é uma hipótese de civilização onde línguas / antiquíssimas não sabiam o que dizer. Disseram / contudo. E agora, estupefactos, incapazes de corte, / lançamos ao tempo a prisão de certas perguntas. / Quando o importante seria responder ao mundo.»

Silva Carvalho, New England, Sintra, Edições Aquário, 2002, p. 12 (Poesia).


Um Homem das Arábias de Deana Barroqueiro

Um Homem das Arábias, o terceiro romance da colecção Cruzeiro do Sul, inicia a saga do Escudeiro Pêro da Covilhã, o espião de D. João II, especialmente escolhido pelo rei para as missões impossíveis.

Nos finais do Século XV, Pêro da Covilhã parte em busca da rota das especiarias e do mítico reino do Prestes João, viajando primeiro até ao Cairo com Afonso de Paiva e depois sozinho por três continentes, disfarçado de mercador mouro. Aventureiro dos quatro costados, misto de globetrotter, Indiana Jones e James Bond, Pêro da Covilhã possuía talentos extraordinários que o distinguiam de entre os grandes homens do seu tempo: uma memória quase fotográfica, a arte de criar os mais perfeitos disfarces para assumir novas identidades, uma mestria no manejo de todas as armas da época e a capacidade de falar árabe como um natural e aprender rapidamente as línguas mais estranhas. Primeiro nas missões de espionagem em Fez, depois durante a sua viagem de cerca de quatro anos pelo Oriente (1487-1492), enfrentou dificuldades e perigos terríveis e viu prodígios de tal modo espantosos – quer nas zonas desertas do norte de África e da Arábia, na selva monçónica ou na floresta tropical da Índia, quer ainda nas savanas e bosques espinhosos da costa oriental africana ou nas terras da Abissínia do Reino do Prestes João. Poucos homens se puderam gabar de ter uma vida e um saber de experiências feito, sequer próximos dos seus, pois conheceu lugares, povos e animais nunca antes contemplados por olhos europeus.

Esta Colecção destina-se não a um público infantil, mas a leitores já do Ensino Secundário e Universitário (e também a adultos de espírito jovem e aventureiro!), visto alguns romances abordarem com crueza temas e episódios verídicos que poderão ser eventualmente chocantes para determinadas sensibilidades. Escrevo intencionalmente para leitores desta faixa etária por achar que têm recebido muito pouca atenção da parte dos escritores nacionais, na medida em que, para este público, praticamente só se encontram no mercado livreiro traduções de autores estrangeiros, como Tolkien, enquanto abundam as colecções de romances portugueses para menores de 15 anos. Talvez, por isso, tantos jovens adultos afirmem não gostarem de ler...

Nos livros anteriores, as ilustrações de Lídia Lobo reflectiram igualmente o cuidado e preocupação de dar a conhecer os ambientes, desde os trajos, aos objectos ou às paisagens, apesar de serem romances de aventuras e não puras biografias históricas. Na saga de Pêro da Covilhã, a ilustradora optou por uma linha mais simbólica, para traduzir o imaginário português face ao Oriente.

Deana Barroqueiro, Um Homem das Arábias, Lisboa, Livros Horizonte, 2002. Coleccção "Cruzeiro do Sul" (Ficção).


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