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Recensões

Vozes da Paixão
Almeida Faria
Lisboa, Ed. Caminho, 1998

Vozes da Paixão
de Almeida Faria

As Vozes da Paixão de Almeida Faria nada deixam a dever aos monólogos interiores das personagens do romance A Paixão do mesmo autor. Enquanto no romance o diálogo é entre o leitor e a interioridade das personagens (sonhos, aspirações, vivências, obsessões, medos), no texto dramático o diálogo dá-se entre o público e a exteriorização do pensamento das personagens através da palavra dita. Verifica-se que a palavra dita tem uma força incontida, chocante. As fala de Piedade, a criada, as falas de Marina, a senhora da casa, chocam. Não pelo grotesco do que passam significar, mas pelo dito em si aparentemente inócuo. A personagem Moisés cresce de dentro (no romance) para fora (no texto dramático).

Não quer isto dizer que o romance lhe é inferior. São tempos vividos pelas personagens (e pelo leitor-espectador) de forma diversa, com um ritmo próprio em cada género. Esse ritmo releva muito da poesia. Almeida Faria preferiu, e bem, a adaptação do romance ao verso em vez da adaptação à prosa, solução talvez mais fácil mas artisticamente mais débil. Com o verso, o autor recriou o texto, impôs um novo ritmo, condensou o rio interior das personagens, construiu um novo livro.

José Leon Machado, Junho de 1998

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