As Ideias de Eça de Queirós
António José Saraiva
Lisboa, Gradiva, 2000
de António José Saraiva
Poucos autores terão tido tão decisiva influência em sucessivas gerações de leitores, alunos e docentes, como A.J.S., co-autor do manual de História da Literatura Portuguesa, de apreciados trabalhos no âmbito da História da Cultura ou de ensaios monográficos sobre alguns dos nomes maiores da Literatura Portuguesa. Aliás, a estatura dos grandes críticos e ensaístas mede-se sobretudo pelos grandes autores que comentam de um modo pessoal e inovador.
A tese do ensaio é que a ficção, a crónica ou o ensaio de Eça constituem um pronunciamento sobre os factos histórico-culturais do seu tempo. São determinados por ideias apriorísticas, que ora são glosadas em textos críticos, ora ilustradas com fábulas romanescas, ora até explicitamente enunciadas por personagens. É sobretudo na ficção que o estilista comanda o ideólogo: ideias correntes, bebidas ou não em pensadores franceses (Proudhon, Michelet, Hugo, Taine, etc.), são fórmulas admiravelmente revestidas pelo autor.
Sobretudo na fase de combate naturalista e de inquérito à sociedade portuguesa, Eça conta histórias para demonstrar ideias, arma fantasias ficcionais sobre teses: panteísmo da Natureza; reacção anti-burguesa; concepção estereotipada da mulher; perspectiva sociológica e determinista da Arte; etc. A relativa artificialidade do processo, pouco compatível com a espessura psicológica das personagens, será objecto da censura de Machado de Assis.
Em relação a esta obra, um reparo apenas para a falta de indicações bibliográficas precisas, de preferência em rodapé. Já entre os méritos deste ensaio, destaque-se a primazia do texto queirosiano e a originalidade das propostas interpretativas. Este premiado ensaio é o mais recente título das obras do autor na adequada reedição da Gradiva, perfazendo já um conjunto de quase uma vintena de títulos. Editado originalmente em 1943, a presente edição coincide com as comemorações do I Centenário da Morte de Eça de Queirós. Constitui ainda hoje uma boa introdução à ideologia queirosiana.
Cândido Martins, Outubro de 2000