Alberto Oliveira Pinto

Alberto Oliveira Pinto

Alberto Oliveira Pinto nasceu em Luanda em 1962. É autor dos romances Eu à sombra da figueira da Índia (1990), Concerto na Nespereira (1991), O Saco dos Livros (1991), O Senhor de Mompenedo (1992), O Onagro de Sintra (1994), publicados nas Edições Afrontamento, e A Sorte e a Desdita de José Policarpo (1995), publicado pela Bertrand, este último distinguido com uma Bolsa Jovens Criadores do Centro Nacional de Cultura em 1992. Publicou ainda os livros juvenis A Família dos Paladinos (1991) e A Canção de Rolando (adaptação, 1991) na Edinter e As Filhas do Olho de Vidro (1996) na Civilização Editora. Colaborou na RTP enquanto guionista, com destaque para o programa Rua Sésamo, e é animador cultural de literatura em várias escolas de Lisboa, no âmbito do Programa de Sensibilização à Criatividade e à Leitura do Departamento de Educação e Juventude da Câmara Municipal de Lisboa. É membro da Associação Portuguesa de Escritores (APE) e da União dos Escritores Angolanos (UEA).


ALGUNS TEXTOS CRÍTICOS SOBRE O AUTOR

Aos oito anos descobriu que existiam histórias que também tinham movimento, e que se passavam dentro de uma caixa a que chamavam 'televisão'. Alberto Oliveira Pinto estava demasiado habituado às gentes e aos modos de Angola, em que todos os domingos iam para a praia, e o seu motorista José ou a lavadeira mulata lhe contavam histórias, para não ficar espantado com aqueles desenhos animados que Portugal lhe oferecia à sua chegada. E quando lhe caiu nas mãos a banda desenhada do Tintin, todas as angústias de adaptação ao novo país foram varridas pelo deslumbramento. É um contador de histórias desde aí: escrevia cadernos e mais cadernos com descrições de filmes, versões de fábulas, ficções inventadas, que hoje estão guardadas num baú da sua casa. Walter Scott, Salgari, Charles Dickens ou Alexandre Dumas são os seus «meninos exemplares» da arte de bem contar, de quem reconhece influências nos livros que escreve. E que ele gostaria que fossem bem conhecidos, porque está ansioso por assumir o papel de escritor no sentido pleno da palavra: ofício, dedicação, estatuto, projecto de vida. Só que na altura das escolhas de vida, não teve coragem de escolher Letras e assumir o conflito aberto com a família, que o destinava para economista. O máximo que condescenderam, então, foi em aceitar um filho advogado que, entretanto, fazia todo o possível por escrever e editar. Alberto Oliveira Pinto não acredita na falência da literatura nem numa sociedade estritamente tecnológica. «Está-se a notar, na ficção, a necessidade de se voltar àquilo que o escritor era no século XIX: o contador de histórias. As pessoas têm sempre necessidade de uma ficção, de um mundo que não é o delas.»

Revista Ler, Inverno de 1993



REGICIDA DE D. JOSÉ I PROTAGONIZA ROMANCE DE ALBERTO OLIVEIRA PINTO

Lisboa, 15 Nov (Lusa) – A Sorte e a Desdita de José Policarpo, romance de Alberto Oliveira Pinto sobre o único regicida de D. José I que escapou ao suplício, é lançado dia 23 no Centro Cultural de Belém, Lisboa.

Com chancela da Bertrand Editora e um preço de capa de 2.800 escudos, este é o sétimo livro publicado pelo autor, cujo projecto foi distinguido, em 1992, com uma Bolsa Jovens Criadores do Centro Nacional de Cultura / Instituto Português da Juventude.

Alberto Oiveira Pinto declarou à Agência Lusa que as primeira ideias sobre a obra surgiram em 1990, quando terminava O Onagro de Sintra.

Quatro anos de preparação, mais um inteiramente dedicado a, gestação foi o tempo despendido pelo autor a dar corpo a esta narrativa histórica sobre o sicário José Policarpo, partícipe no regicídio do monarca e único que escapou à justiça.

De facto, José Policarpo desapareceu e, emboca com a cabeça a prémio por 10 mil cruzados, nunca o encontraram pelo que foi queimado em efígie no dia 13 de Janeiro de 1759, na Praça do Cais em Belém – hoje Praça Afonso de Albuquerque, no jardim frontal ao Museu dos Coches.

O "guia fundamental" do autor foi a biografia do Marquês de Pombal de Mário Domingues, bem como u m conjunto de artigos de Camilo Castelo Branco – que detestava o ministro de D. José I – publicados em forma de cartas a Gonçalves Crespo no centenário da morte de Sebastião José de Carvalho e Melo.

Na ficção de Alberto Oliveira Pinto, José Policarpo é mestiço e bastardo – filho de uma ligação do irmão mais velho do duque de Aveiro com uma negra.

O sicário surge também como protegido do Marquês de Pombal e, daí, a conclusão de que o regicídio, afinal, não terá passado de uma "inventona", em palavras do autor.

Este pormenor, e ainda, a circunstância de dois capítulos serem passados em Luanda, tornam o livro a primeira ficção portuguesa em que os africanos surgem como protagonistas, talvez numa homenagem do autor à sua Angola natal.



O "REINO" DO MARQUÊS

Este é um romance histórico, que retoma a tradição da reconstituição de um passado nas suas vertentes política, social e a individual. Neste caso, do século XVIII português, mais precisamente da época pombalina. O episódio romanceado é o atentado a D. José. A versão oficial é a de que um grupo de sicários a soldo do duque de Aveiro e dos marqueses de Távora tentou m atar o rei à saída de Lisboa na noite de 3 de Setembro de 1758. O romance retoma o episódio integralmente, como núcleo principal. A personagem principal, José Policarpo de Azevedo, é um dos conspiradores. A escolha ficcional deste conspirador, mais de dois séculos depois, deve-se ao facto do seu percurso constituir uma excepção. Ligado ao marquês de Pombal desde o dia do terramoto de 1755, José Policarpo envolve-se nos acontecimentos do atentado ao rei mas, protegido pelo marquês, é perseguido apenas na aparência, e a sua captura é evitada. Pombal forja uma identidade falsa e José Policarpo parte para o Marão como padre jesuíta, Francisco de Léon, uma identificação que corresponde a um padre dado como morto mas mantido como prisioneiro em segredo. Entretanto, os outros conspiradores vão sendo eliminados.

O modo como o material romanesco surge apresentado é problemático. O romance é escrito em cenas narrativas separadas umas das outras pela menção do local e da data, mas sem uma sequência cronológica, sendo que entre uma e a seguinte se verifica, por vezes, um desfasamento de mais de quinze anos. Ao mesmo tempo, o narrador avança com várias intrigas: os amores de Joana do Pinto, a vida do par Marta Maria e Domingos Famalicão, a velhice do marquês de Angeja, etc. A primeira metade do livro é composta por essas várias intrigas que se desenvolvem de um modo entrecortado, porque todo o romance é feito por cenas sem relação directa entre si, e a paciência do leitor pode não ser tanta quanto o exige a fragmentação do relato das intrigas. Resumindo: é um romance com qualidades que se lê com dificuldade. O leitor tem que recompor partes demasiado dispersas num todo de difícil apreensão.

Convirá, ainda, saber o que o romance ganha com esta organização problemática, que poderia corresponder à necessidade de uma outra interpretação dos acontecimentos narrados ou da época representada; não é o caso. A dispersão cronológica não acrescenta nada, e a narrativa fica à superfície dos factos históricos representados, não demonstrando um trabalho de aprofundamento dos discursos da época quer em sentido literal quer em sentido mais extenso. Ou seja: os discursos das personagens e do narrador não se diferenciam daquilo que um pessoa medianamente culta supõe que eram os discursos da época. Mas uma pesquisa de documentos desse tempo, aupõe-se também, revelaria outros discursos. Além disso, uma época tem o seu próprio modo de pensar a realidade, modo esse que se traduz nos textos escritos (à falta do vivido do tempo). É essa "diferença" estabelecida pela própria textura da época que pode tornar um romance histórico pertinente nos dias de hoje.

Alberto Oliveira Pinto não é um principiante: tem cinco romances publicados (desde 1990) e uma intensa actividade de uma escrita considerada como animação cultural. A quantidade encontra-se assegurada. Talvez seja tempo de repensar a noção de que um romance cria um universo próprio. Aqui, a época representada é frequentemente indiferenciada por lugares-comuns que não foram postos em causa. A não ser que o intuito do autor fosse apenas o de lembrar ao leitor que em tempos houve uma figura polémica, a do marquês de Pombal, que "reinou" em Portugal até 1776. Como propósito de autor de romance, é pouco ambicioso.

Eunice Cabral, em Público, 20/01/1996



FÁBULAS CONTADAS...

...e fábulas contadas são estas, que tenho sobre a mesa, três obras que constituem uma trilogia textual, um Tríptico (des)figurativo, uma plurifonia de acertos e desacertos à escala humana.

As personagens têm nomes bem sonantes, senão significativos, desde o Senhor de Mompenedo até Simão-o-Pêga, desde a Dona Maria de São José até ao General Sómazelas; temos ainda, entre outros e outras, um Ricardo Plantageneta e, sobretudo, um Augusto da Pontinha, também conhecido por Guga; para não falar do ditador Carnelúbio e dos cerra-fileiras do Príncipe Yvoar...

Desde o primeiro citado, que é (um) macaco, até aos últimos, que são gaivotas, estamos aqui a falar de animais e de três obras de Alberto Oliveira Pinto, que lhes são consagradas. Mas, atenção, os animais deste autor não são como os Bichos de Miguel Torga ou como os integrantes dos Bestiários de Maurice Genevoix, por exemplo. Também não são como a raposa do seu aquiliniano romance.

Nota-se, insofismavelmente, que a bicharada de Alberto Oliveira Pinto ultrapassa a natureza própria, a rotina do seu viver ecológico e respectivas agruras, a circunstancialidade do seu habitat. Aqui, os animais nossos amigos (ou inimigos) reflectem-nos a nós, primatas privilegiados, absurdos, nefelibatas e paranóides, nas diferentes manifestações em que nos revelamos, transcendendo o macaco, a pega, o mocho, o corvo, o cisne, a gaivota..., pela prepotência gratuita, pela ganância, pelo materialismo de um comportamento cego ao espírito das luzes, das artes da benevolência.

Como se poderá deduzir do que atrás fica escrito, estas obras não são simples narrativas: implicam uma posição (do Autor) social, política, filosófica, ética.

Esta bicharada é participante numa comédia, tão penosa como qualquer outra comédia (sobretudo humana). Esta bicharada (repito), embora não antropomorfizada, consubstancia histórias próprias dos homens, para homens, sobre homens. Ninguém repara se, por acaso, não é «com homens».

Falemos de alegoria, falemos de moralidade. Falemos, pois, de fábulas, quod erat demonstrandum.

F. B., em Colóquio/Letras


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