Damião de Góis

Damião de Góis

Damião de Góis nasceu em Alenquer em 1502 e faleceu na mesma vila em 1574. É considerado o maior humanista português e um dos maiores na Europa. Conviveu com Erasmo, Lutero, imperadores, reis, príncipes e outras personalidades da vida política e cultural da Europa do século XVI. Viajou por vários países europeus como escrivão da fazenda e como embaixador de Portugal. Foi perseguido pela Inquisição por suspeitas de heresia e por simpatizar com as ideias erasmistas e protestantes. Escreveu várias obras em português, mas foi como latinista que se distinguiu. O escritor Fernando Campos escreveu uma bibliografia romanceada deste autor intitulada A Sala das Perguntas (Difel, 1998).

Obras em latim: Legatio Magni Indorum Imperatoris Presbyteri Joannis (1532); Fides, Religio, Moresque Aethiopium (Lovaina, 1540); Aliquot Opuscula (Lovaina, 1544); Commentarii Rerum Gestarum in India, Citra Gangem a Lusitanis Anno 1538 (Lovaina, 1539); Urbis Lovaniensis Obsidio (Lisboa, 1546); De Bello Cambaico Ultimo (Lovaina, 1549); Urbis Olisiponis Descriptio (Évora, 1554).

Obras em português: Crónica do Felicíssimo Rei D. Manuel (Lisboa, 1566-1567, em quatro partes); Crónica do Príncipe D. João (Lisboa, 1567).




PROLOGO NA CHRONICA DEL
REI DOM EMANVEL, DIRIGIDA PER
DAMIAM DE GOES AHO SERENISSIMO PRINÇIPE
dom HENRRIQVE, Infante de Portugal,
Cardeal do titulo dos sanctos quatro
Coroados, filho deste
feliçissimo REI.

Muitos, & graues authores nos prinçipios de suas Chronicas trabalharam em louuar ha historia, da qual tudo ho que dixeram foi sempre muito menos do que se deuia dizer, porque assi quomo ella he infinita, assi seus louuores nam tem fim, nem termo a que se possam reduzir, & pois tudo ho trattado nesta parte, he quasi nada em comparaçam do que deue ser. Voltarei daqui ha velar pera poer ha proa nesta: na qual por çerto não ousara, nem deuera de tocar, se me nam fora mandado per. V. A. por ser de qualidade, que depois dalgüas pessoas ha terem começada, elRei dom Ioam vosso irmão, que sancta gloria haja, lhes mandou tomar ho que ja tinham scripto, pera se acabar per outros, de cujas habilidades tinha mor opinião, em mãos dos quaes ficou atte seu faleçimento. E consyderando. V. A. que pois estas pessoas, de que se tanto speraua, nam tinham feito em tempo de trinta, & sette annos, que ha que elRei dom Emanuel vosso pai faleçeo, cousa que respondesse aho mereçimento de tal negoçio, sem se lembrar de quão fraco eu deuo ser pera hum tamanho peso, me mandou neste anno do Senhor de M.D.LVIII, que daquillo em que muitos, quomo em cousa desesperada, se nam atreueram poer ha mão, tomasse eu ho cuidado, ho que fiz com mor ousadia do que a meu fraco juizo conuinha, mouido com tudo por sos dous respeitos, ho hum por eu ser fectura do dito senhor Rei vosso pai, criado em sua casa, & em seu seruiço, desde idade de noue annos, ho outro por me pareçer que se nam mouera. V. A. a me mandar cousa em que consistiam, todolos feitos, & louuores deste feliçissimo Rei, & daquelles que ho seruiram na guerra, & na paz, senam por confiar de mï ho mais substançial que no screuer das Chronicas se requere, que he com verdade dar a cada hü ho louuor, ou reprehensam que mereçe. Pelas quaes razões matreui a tomar este trabalho, ho qual tal qual he me pareçeo que não deuia, në era bë que dedicasse senam a. V. A. quomo a prinçipal author de ha fama, & gloria del Rei seu pai sairem luz, & nam pereçer ha lembrança das cousas notaueis que aconteçeram ahos Portugueses per todo ho discurso de seu Regnado.


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