Américo Olavo

Américo Olavo Correia de Azevedo (1881-1927) nasceu no Funchal a 16 de Dezembro de 1881. Fez parte, como capitão de infantaria, das tropas portuguesas que se bateram em França ao lado dos aliados, sendo condecorado com a Cruz de Guerra e com a 3ª classe da ordem da Torre e Espada por actos de bravura praticados durante a campanha. Tendo sido feito prisioneiro pelos alemães na Batalha de La Lys (9 de Abril de 1918), só voltou a Portugal nos princípios de 1919. Foi eleito deputado pelo Funchal nas eleições que se realizaram em 11 de Maio do mesmo ano. Maçon desde 1901, foi membro do grupo dos Jovens Turcos, sucessivamente democrático e reconstituinte. Exerceu o cargo de Ministro da Guerra de 8 de Maio a 6 de Julho de 1924. Morreu na revolta de 8 de Fevereiro de 1927. Escreveu a obra memorialista Na Grande Guerra (Guimarães & Cª Editores, 1919). Em coautoria com Chagas Franco, publicou a colectânea Centro da vida; Os preconceitos da viscondessa; Suzana; Rebelde; Cartão de uma noiva; O pequeno cantor; Estéril; Uma Tragédia (Liv. Guimarães, 1909).




NA GRANDE GUERRA


Quando em 7 de Agosto o ministério a que presidia o Dr. Bernardino Machado apresentou às Câmaras a proposta para que Portugal acompanhasse a sua velha e fiel aliada, não fez mais do que pedir-lhe uma sanção, um assentimento que as disposições constitucionais tornavam obrigatório para adoptarmos uma conduta nacional, a que de facto, por circunstância alguma poderíamos eximir-nos. Nessa data a nossa atitude futura estava já fatalmente determinada e o nosso lugar entre as nações em luta rigorosamente marcado, por forma tão clara, tão evidente, que só cegos de entendimento poderiam deixar de ver.

Com efeito tinha Portugal de longa data o seu tratado com a Inglaterra pelo qual, em caso de guerra ofensiva contra esta, era obrigado a prestar-lhe o seu concurso, o seu auxílio contra a nação agressora. E se os tratados para as nações sem honra não são mais do que bocados de papel que espíritos sem o sentimento do valor das convenções e mãos brutais podem desprezar ou despedaçar, para outros são compromissos que forçam irremissivelmente, a despeito, não importa de quantas dificuldades, de quantos sacrifícios, de quantas lutas, mesmo da fatalidade, da ruína, da destruição, do aniquilamento.

Portugal rico de maravilhosas tradições, de admiráveis ousadias que abriram aos demais povos ocidentais todos os recantos do mundo, dominado por prejuízos de nobreza e de cavalheirismo, próprios das raças latinas e animados e requintados em séculos de gloria e de esplendor, fiando muito a sua segurança e a conservação dos seus domínios no estabelecimento de ligações com povos fortes com os quais tenha comunidade de interesses, não poderia por sua honra nem sequer por sentimento da própria conveniência, - renegar a sua promessa de concurso no momento em que lhe fosse pedido, se não entendesse melhor fazer a prévia declaração de que dentro dos seus recursos acompanharia mesmo aos mais infortunados destinos a sua aliada, com a qual voluntariamente tratara e à força da qual devera talvez tantos anos de paz externa, de tranquilidade e de equilíbrio nas relações com os demais povos.

Senhor de vastos e afastados domínios a cujas necessidades de defesa, de administração e de intercâmbio a sua reduzida frota de comércio não poderia bastar, necessitado duma ligação íntima e constante com o Brasil que com o peso do seu oiro lhe equilibra a balança comercial e de relações permanentes com os demais países de que importa as mercadorias indispensáveis à alimentação da sua população, estaria condenado ao isolamento, à ruína e ao desmembramento, desde a hora fatal em que lhe faltasse o concurso, o auxílio dos povos que, mercê da supremacia marítima, conservassem, detivessem a liberdade dos mares para satisfação das suas necessidades de ordem comercial e industrial. E sendo as suas duas maiores colónias mordidas profundamente na superfície do continente africano, confinantes com territórios dalguns dos povos em guerra, porventura dos dois que a aspiração de hegemonia sobre o mundo mais sacudiu e assanhou, reservava-as o futuro para teatro de sangrentas e duradouras operações em que se empenhariam as forças coloniais dum e doutro, às quais a escassez das nossas e a falta de tonelagem própria, indispensável à sua sustentação e reforço, nem poderiam impedir nem ao menos criar um arremedo, sequer, de embaraço. E quem sabe os ignorados destinos que a esses teatros de operações, ou melhor, de ocupação por parte do vencedor, estariam reservados, um dia, chegado o momento das negociações, da imposição duma nova ordem de cousas, impeditiva de futuras guerras sem que à mesa, em torno da qual se reunissem os representantes dos lutadores num desejo tardio de reconciliação, se sentasse também um delegado português, porta-voz dos nossos direitos e afirmação viva do nosso esforço, dos nossos sacrifícios, da nossa comparticipação.

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