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Luís António Verney


Luís António Verney

Luís António Verney nasceu em Lisboa em 1713 e faleceu em Roma em 1792. Estudou Filosofia na Casa do Oratório em Lisboa e na Universidade de Évora. Com 17 anos de idade, terminou o bacharelato em Filosofia e licenciou-se dois anos depois na mesma área científica. Partiu então para Roma, frequentando o curso de Teologia. Regressando a Portugal, dedica-se ao ensino e em 1741 é nomeado pelo papa arcediago de Évora. Só em 1749 é que recebe ordens presbiterais. Parte definitivamente para Roma devido a problemas de saúde e principalmente devido a incompreensões por parte dos seus compatriotas. Em 1746 publica o Verdadeiro Método de Estudar. É uma obra redigida sob a forma epistolar que se apresenta dividida em dez cartas, tratando questões relacionadas com as disciplinas lecionadas na época e com questões pedagógicas, como o acesso da mulher à cultura.










VERDADEIRO MÉTODO DE ESTUDAR (extracto)

ESTILO SIMPLES E ESTILO MEDÍOCRE

Ao estilo sublime contrapomos o estilo simples ou humilde. Assim como as coisas grandes devem explicar-se magnificamente, assim o que é humilde deve-se dizer com estilo mui simples e modo de exprimir mui natural. As expressões do estilo simples são tiradas dos modos mais comuns de falar a língua; e isto não se pode fazer sem perfeito conhecimento da dita língua. Esta é, segundo os mestres da arte, a grande dificuldade do estilo simples. Fácil coisa é a um homem de alguma literatura ornar o discurso com figuras; antes todos propendemos para isso, não só porque o discurso se encurta, mas porque talvez nos explicamos melhor com uma figura do que com muitas palavras. Pelo contrário, para nos explicarmos naturalmente e sem figura, é necessário buscar o termo próprio, que exprima o que se quer, o qual nem sempre se acha, ou, ao menos, não sem dificuldade, e sempre se quer perfeita inteligência da língua para o executar. Além disto, as figuras encantam o leitor e impedem-lhe penetrar é descobrir os vícios que se cobrem com tão ricos vestidos. Não assim no estilo simples, o qual, como não faz pompa de ornamentos, deixa considerar miudamente os pensamentos do escritor...

Isto que digo das expressões comuns e naturais deve-se entender com proporção. Não quero dizer que um homem civil fale como a plebe, mas que fale naturalmente. A matéria do estilo humilde não pede elevação de figuras, etc., mas nem por isso se deve exprimir com aquelas toscas palavras de que usa o povo ignorante. Não é o mesmo estilo baixo que estilo simples. O estilo baixo são modos de falar dos ignorantes e pouco cultos: o estilo simples é modo de falar natural e sem ornamentos, mas com palavras próprias e puras. Pode um pensamento ter estilo sublime, e não ser pensamento sublime; e pode achar-se um pensamento sublime, com estilo simples. Explico-me. Para ser sublime o estilo, basta que eu vista um pensamento e o orne com figuras próprias, ainda que ó pensamento nada tenha de sublime. Pelo contrário, chamamos simplesmente sublime (com os retóricos) àquela beleza e galantaria de um pensamento que agrada e eleva o leitor, ainda que seja proferida com as mais simples palavras. De sorte que o sublime pode-se achar em um só pensamento nu figura, etc. Importa muito entender e distinguir isto, para não ser enfadonho nas conversações e nas obras que pedem estilo humilde.

Verdadeiro Método de Estudar

Do que... tenho dito fica claro qual é o estilo medíocre: aquele, digo, que participa de um e outro estilo. Também este estilo não é pouco dificultoso, porque é necessário conservar uma mediania que não degenere em viciosos extremos. e são poucos aqueles que conhecem as coisas na sua justa proporção e formam aquela ideia que merecem. Já disse que a matéria é a que determina qual há-de ser o estilo; e assim uma matéria medíocre pede um estilo proporcionado. A maior parte das coisas de que falamos são medíocres; e daqui vem que neste estilo de falar deve-se empregar um homem que quer falar bem e conseguir fama de homem eloquente. Um homem de juízo, que conhece as coisas como são, Forma delas ideias justas e verdadeiras, e as explica com as palavras que são mais próprias. Donde vem que o estilo medíocre compete propriamente às Ciências todas, à História e outras coisas deste género, nas quais se representam coisas não vis, mas medíocres; porém representam-se da mesma sorte que são, e com palavras próprias. Também as cartas de negócios graves, ou eruditas, e aquelas de cerimónia a pessoas grandes, etc., costumam ser neste estilo. É, porém, de advertir que o estilo medíocre admite todos os ornamentas da arte: beleza de figuras, metáforas, pensamentos finos, belas descrições, harmonia do número e da cadência. Contudo, não tem a vivacidade e grandeza do sublime. Participa de um e outro, sem se assemelhar a nenhum. Tem mais força e abundância que o simples, menos elevação que o sublime, e prossegue com passo igual e mui brandamente.

Verdadeiro Método de Estudar, Carta VI.



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