ZECA AFONSO

Gastão era perfeito

    Gastão era perfeito
    Conduzido por seu dono
    Em sanolências afeito
    Às picadas dos mosquitos

    Era Gastão milionário
    Vivia em tapetes raros
    Se lhe viravam as costas
    Chamava logo a polícia

    Em crises de malquerência
    Vinha-lhe o gosto pela soda
    Mas ninguém se abespinhava
    Que enviuvasse às ocultas

    Nem Gastão se apercebia
    De quanto a vida o prendara
    Entre estiletes de prata
    E colchas de seda fina

    Gastão era deste jeito
    Fazia provas reais
    Gastão era um parapeito
    De Papas e Cardeais

    Vinha-lhe só por fastio
    Nos tiquetaques da vida
    Um solene desfastio
    Pela mãe que era entrevada
Mandava bombons recados
Por mensageiros aflitos
Não fora Gastão dos fracos
E já seria ministro


Conheci-o em Alverca
Num bidon de gasolina
Tinha um pneu às avessas
Mas de asma é que sofria


Nos solestícios de Junho
A quem o quisesse ouvir
Dizia que era sobrinho
Do Fernão Peres de Trava


Querem saber de Gastão?
Vão ao Palácio da Pena
Usa agora capachinho
E gosta de codornizes


Tem um sinal que o indica
Como o mais forte Doutor
Espeta o dedo no queixo
E diz que é Nosso Senhor