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Ensaios


Moby Dick e a recuperação da memória. Portugal na sua atlanticidade

Foi ali no Atlântico que tudo começou, nesse mar de águas proibidas feito de abismos e de fúrias, morada de monstros e de deuses, fronteira última da terra Por isso fez-se aos olhos dos homens infinito e secreto povoado de magia, superstição e terror. Livre de Acab, a rolar mansamente o bojo em forma de ilha, navegava então solene e sublime Moby Dick. O seu canto ouvia-se à distância por sobre a transparência das águas em dias de calmia, e ao ouvido aterrado de qualquer ser humano mais parecia um «pranto de luto» (1), que – interrompido e logo devolvido – abalava e enfronhava o coração dos homens: Até que certo dia, exaurida de solidão, a Baleia decide quebrar o encanto e os medos, e anunciar a Portugal, logo ali no extremo do mar, que o Oeste não tem fim e que as ilhas, há muito a navegar no imaginário dos homens, são sem dúvida uma realidade. Estão no longe, mas relativamente próximas, e não são uma nem duas, sendo que as mais ocidentais, isoladas e distanciadas entre si se fecharam em ovo (2), num espaço próprio e autónomo, entre os continentes, na dita microplaca açoriana, destinadas que foram por Moby Dick a unir num só nó as placas continentais envolventes. Herdaram por isso da Baleia o dom da ubiquidade – um preço exigido a Portugal, por parte de Moby Dick, como meio de redimir, de cena forma, o pecado por ela cometido em relação ao que acabava de desocultar. Consistia esse preço na possibilidade desde logo de Portugal as encontrar, sem que porém fosse possível desvendá-las ou descobri-las na sua totalidade – tão móveis e inapreensíveis seriam elas, consignadas que estavam a um mar, céu e terra de cúmplice entrega e ocultação, abertura e circunscrição, luminosidade e trevas.

Congregavam essas ilhas o potencial do devir, porque centro de todos os opostos, e a polivalência do desconhecido. Navegariam, por isso, soltas nos mapas dos homens e precariamente presas à mocada dos deuses (3). Tal como Jonas, entrariam em longos períodos de obscuridade, de mortes iniciáticas, para outros retornos de glória e luz; ora imprescindíveis ao mundo conhecido e por-conhecer; ora novamente esquecidas, e de novo remetidas ao ventre da Baleia (4). Uma sina que obrigaria a quem as encontrasse um duplo olhar em contínuo movimento de lançadeira – quais Parcas a tecerem futuros destinos de opostos feitos, aí, onde se faria Portugal inteiro, e por extensão toda a Europa, ambos sob o fadário de levar a «que o mar unisse, já não separasse»; a que a «orla branca [fosse] de ilha em continente [...] até ao fim do mundo» (5) sob o poder do Espírito Santo para ligar uma raça a outras raças, um povo a outros povos.

Em virtude de tais desígnios, lança Portugal ao mar as suas velas, e «busca o oceano por achar» (6), na mira já não tão só de encontrar, mas de conquistar essas «ilha[s] próxima[s) e remota[s]» (7) anunciadas por Moby Dick, esquecendo-se desde logo os homens das advertências e conselhos daquele cetáceo. Conquistar passou a objecto primordial daquele povo e a partir daí tudo foi bem mais fácil. Acharam as ilhas e delas ao mundo deram novas. Plantaram ali gente e dela se olvidaram. Separadas ficaram as ilhas e o continente; em risco ficando a possibilidade de interdependência mútua, o caminho para a globalidade e a reciprocidade que só acontece no amor. Por isso, como diz Fernando da Costa, «somos, há cinco séculos, um país por completar» (8). E é dessa forma que começa a saga dos que ficaram nas ilhas, e dos quais a História não reza. Atente-se hoje na memória delas, no seu canto de sereia e no seu lamento de dor. Espreite-se um pouco mais longe e ouça-se a voz remota vinda da fundura branca do tempo aonde acedeu a velha Atlântida e, a partir daí, escute-se a toada do homem, escura e luminosa, a retratar fielmente a condição dos que lá ficaram. Martins Garcia, açoriano, professor universitário, crítico literário, escritor e poeta expressa-se assim:

DISTÂNCIAS

acharam os antigos sonhos vivos
a que à pressa chamaram novos mundos
que remos de perder nesta agonia
chamada esmagamento do futuro

acharam deram novas do achamento
nós expulsas do achado flutuamos
e nem sabemos já se o firmamento
é do presente o sonho em mortos ramos
(9)

Na condição de espectador [pois «o por-fazer é só com Deus» (10)] se manteve essa gente – em terra «firme», fora de perigo, à distância –, na espera de um destino. Salvaguarde-se no entanto «firme», porque a terra que lhes coubera em sorte mais não era do que uma base naval; a sua finalidade: fazer pagar e vingar o sonho do Portugal conquistador e, mais tarde, sobreviver à usurpação e perda causadas pelo Reino, pirataria, natureza e uma geografia e história marcadas essencialmente pelo separado e o distante. E foi assim que de início ficaram as ilhas a vogar na grande aventura do mar, «pois aqui não se fez Portugal para ser feito, mas para unir a rota que caravelas e naus iam cumprindo de porto em porto, onde houvesse água e pão, até à viagem completa, que só haveria de o ser muito além da própria Índia» (11). Por isso, «povoamento» – tal como circulava nos documentos oficiais – não será a palavra que melhor traduza a realidade inicial da ilha, desde logo destituída de si, para servir desígnios-outros, na sua totalidade fora dela e à revelia dela própria – comandada de fora, esvaziada de dentro; voltada na generalidade para o que se passava no mundo à distância. A este respeito diz-nos José Enes:

De farto, o objectivo principal não foi o povoamento para a instalação de uma sociedade com o fim da ocupação territorial, exploração dos recursos naturais e expansão demográfica da sociedade de origem. O povoamento esteve desde o inicio subordinado aos objectivos da navegação e da organização comercial [...]. As ilhas para efeito de organização social e administração eram tratadas de uma forma muito semelhante à que era usada com as naus e as caravelas: um regimento à saída e um roteiro à chegada. (12)

Em toda esta contingência de vida, sujeita a um Outro que de tão distante quase se esvaía, voltou-se o homem das ilhas, vulnerável e frágil, no tempo e no espaço, para um mundo que só esse a ele pertencia: um mundo interior, tão sublime e vasto quanto o mar, que dia e noite lhe servia de passadeira para sonhos seus. Tomou-se no entanto esse mar uma extensão sem fim de monotonia e isolamento, tudo isso reduzindo cada vez mais o homem a si próprio, à intensa solidão do seu ser – uma solidão, porém, de estranha ligação com o sentido infinito das coisas e ao mesmo tempo com uma profunda sensação de liberdade sem fronteiras: «Dir-se-ia que o homem se fora cansando do mar, procurando silêncio e assento no interior» (13), diz Nemésio.

A ilha simbolizava então para o Outro todo o fascínio de um universo Desconhecido: ela era fantasia, paraíso, fuga à civilização, recipiente de todos os desejos e sonhos por cumprir: um objecto de descrição, pelo exótico que em si encerrava, e pouco mais; um mero pretexto para o devaneio. Mas, para os que lá ficaram (tal como, no plano da ficção, nos contam as velhas histórias à volta de Robinson Crusoe), o sentimento real era outro: isolamento, incerteza, solidão dor do perdido O sonho concretizável e a redenção não moravam nas ilhas; estavam mais além, para lá do mar. É por isso que a sua expressão literária faz vencer sentimentos do domínio semântico de exílio, naufrágio e orfandade, todos eles condicionados pela eterna distância (14), que independentemente dos tempos, até mesmo de um pós 25 de Abril que a reduziu em parte, continua a constituir a condição mais irreversível daquela gente, embora já não sendo (por diversas razões que se prendem com o progresso e as novas tecnologias) tão condicionante quanto o era ainda no tempo de Nemésio: «Ali nascíamos, ali vivíamos – ali estávamos. E 'estar' é muito mais verbo para ilhéu do que 'viver'.» (15)

E o mar, e esse sempre mar (prometido a Portugal Para criar, através das ilhas-a-encontrar, o que viria a chamar-se atlanticidade – eixo de ligação entre três continentes, expansividade por aproximação do espaço luso-europeu), permanece ainda hoje incerto e espectante. E, enquanto a promessa não se vê cumprida, cativas continuam a ficar as ilhas desse olhar à distância possessivo, para além das águas. Permanecem assim solitárias como «grandes navios verdes [...] que navegam / ancorados, para sempre; / sob as águas / enormes raízes de lava / / prendem-se firmes / a meio Atlântico / / ao passado // a distância amplia-se / /um vazia à popa, / os Açores sumidos. /o vácuo atrás e o vácuo / à frente são o mesmo.» (16)

Embora, inicialmente, encruzilhada de rotas náuticas – ponto de indispensável passagem para caravelas de Índias carregadas –, mais tarde, com o império a envelhecer, as ilhas perdem a função de base naval para passarem a «possessões ultramarinas» com a designação de Ilhas adjacentes. «Ilhas adjacentes», cogitava então Moby Dick, num grito de profundo lamento contra a curta memória dos homens, contra a feroz vontade de tudo querer vencer e de possuir sem amar. Então não se havia dito que aquelas ilhas só poderiam ser encontradas? É que só nessa forma poderiam elas viver do cruzamento do olhar aonde convergem o mundo apocalíptico e o mundo cíclico da natureza; um olhar de dentro e de fora, cujo exercício devolveria a Portugal essa dica dupla natureza (17) que, para Moby Dick, transforma as pequenas coisas nos mais nobres feitos da humanidade.

Assim, destituídas do seu próprio olhar, apenas identificadas pelo seu sentido utilitário, mantiveram-se desconhecidas durante muito tempo à maioria das suas gentes. Enquanto que visitadas por alguns estrangeiros à procura de aventura – uns para as estudar, ovo-os para a mirar e delas contar (18) –, aos olhos do seu Portugal (ele próprio feito ilha) (19) ficava o arquipélago esquecido, perdido na bruma do tempo, apagado no imaginário e na memória do seu país. E assim continua tudo tão precário e vulnerável – sendo certo que a aproximação ao inefável das ilhas comporta os seus riscos, o facto porém é que sem aproximação elas deixam de existir, subtraídas que ficariam do seu lado-outro que lhes empresta a natural ambivalência e lhes dá, por isso, existência. Requerem aquelas ilhas o profano, enquanto que vulcanicamente protegem e amparam a casa dos deuses. São ilhas infalivelmente imprevisíveis e eternamente provocadoras; resistem à matéria física e aderem conjuntamente ao espírito da mesma, ao interior de todas as coisas. Dissentem da possessão e não podem prescindir da aproximação – assim as fadara Moby Dick, essa Baleia que ronda os mares dos Açores e que está presente ao mesmo tempo em toda a parte e na sua mais variada expressão cetácea. Um mistério que com os outros mistérios ali guardados se desembuçam a qualquer hora do dia, tornam-se praticamente palpáveis e logo se recolhem para mais tarde voltar. Por isso nos diz Tabucchi, ao falar de baleias e Açores, que «se falei de baleias e naufrágios foi apenas porque nos Açores ambos gozam de uma inequívoca concretude» (20), numa clara advertência para o perigo a que ambas estão sujeitas – isto é, a um naufrágio que se deseja a todo o custo evitar.

E são esses mistérios que as sustentam – dizem –, essencialmente nos períodos de total esquecimento: ilhas houve que depois do povoamento e ainda recentemente, para terror e medo daquelas gentes, emergiram no meio das águas para logo regressarem ao «modo indiferenciado da preexistência» (21); terramotos frequentes ao longo dos séculos espalharam temores e acentuaram o sentimento de precariedade e isolamento, devendo-se a existência daquela actividade a movimentos na crusta, com «deslocações apreciáveis a certa profundidade» (22). Trata-se de uma contingência que não se confina à actividade das profundezas da terra; está na superfície, no mar e no céu. Está no próprio descobrimento cuja data permanece uma incógnita (23). Está nas correntes marítimas em circularidade orientadas e temperadas pela corrente quente do Golfo. Está nos ventos desassossegados, inesperadamente contrários; nos anticiclones ali formados para fazer circular massas de ar quente para as zonas frias e destas para as quentes, influindo sobre o clima para uma boa pane do mundo. Está ainda num céu sempre incerto, irrequieto e feiticeiro, de constantes alternâncias entre luz e trevas, num jogo permanente, que apaga, esbate e distancia montanhas e desfiladeiros para logo as desocultar, aproximar e revelar-lhes o pormenor e a espessura. E tudo aquilo intermitentemente seduzido pelo bailado das chuvas, bem perto do inaudível, do acto da Criação. É sobre essa forma de ser e estar naquelas ilhas que Fernando Aires nos conta no seu Diário:

Nesta emergência oceânica, assim tensa de forças contraditorias e mutáveis, o homem insular, síntese da alma antiga e do presente. Alfa e omega e ambiguidade permanente, reflectindo como o seu céu e o seu mar, a mutabilidade continuada de tréguas e bravuras, de sombras e luz Sobrevivência do velho mundo português, crescendo e diversificando-se ao sopro dos ventos que vêm de longes terras onde se falam outras línguas e se tem outro viver. Comunidade una e múltipla, migalhas repartidas de um mesmo todo, espalhando-se para além da sem fronteira do mar. Sentindo com mais aguda percepção a tragédia de estar com os outros mas mais profundamente só... (24)

«Terra firme», dizia-se antes; firme porém só na continuidade dos mistérios que permanecem, quando tudo o resto se agita, muda e altera. Parte da açorianidade daquela gente assenta nessa sua sabedoria de estar em contingência, pois nem sequer os mapas sabem dar repouso às ilhas. Aparecem representadas mais a norte ou mais a sul; ora mais para leste ora mais para oeste; por vezes mais próximas umas das outras, quantas vezes mais distanciadas e até mesmo reduzidas umas e aumentadas outras. E àquela sina não escape a própria história. Quantas vezes nas trevas da desmemória, quantas no centro do mundo com as caravelas das Índias e mais tarde com cabos submarinos que fazem do arquipélago apura e simplesmente o ponto isolado roais importante em todo o mundo, a chave para manter o domínio britânico nas comunicações do Atlântico» (25). Uma vez no nó das rotas aéreas; outra na encruzilhada das guerras mundiais. quando os Açores vivem a período de maior importância estratégica. Mas tudo isso planeado e comandado de fora, pelas potências mundiais, independentemente da posição de Portugal (26) – de um Portugal que não se assume por inteiro, quando por inteiro vão continuando as ilhas por ficar. Separados foram; separados permanecem.

Mas eis que no fim do século ressurge Moby Dick a recordar Portugal, e por contiguidade a Europa, do seu fadário vaticinado antes do encontro com as ilhas. Lembra-lhes que o tempo passa e que urge por isso aproximar o que está afastado. O Sistema político interno alterou-se, no entanto, e o plano de integração europeia acentua a consciência do factor distância. Portugueses do continente ou das ilhas passam a ficar agora irmanados num mesmo sentimento. O reconhecimento mútuo acontece, a identificação intensifica-se – testemunha a Baleia Os Açores aparecem, agora, naquele novo enquadramento como a grande metáfora do país, de um país que vive entretanto o «desespero» da distância, «o sentimento de exílio» frente ao centro europeu. E sendo que nisto as ilhas são incomparavelmente mais distantes, mais forte sentem e dão nome a uma dor presentemente comum à ilha e ao continente. Note-se, a título de exemplo, o que afirma Eduardo Lourenço acerca da nova situação de Portugal na Europa

A Europa é ao mesmo tempo o modelo a imitar e o novo desespero pela distância que dela nos separa. (p. 20)

É relativamente recente, mas inegável, constituindo quase uma fractura da nossa imagem cultural, o sentimento de exílio, de distanciamento e, sobretudo, de autêntico e mórbido complexo de inferioridade em relação a uma outra Europa. (p. 26)

Assim nasceu [...] uma querela de que a Europa é o centro [...]. A partir dela começamos a ser vistos como «outros», a ser objecto de comiseração ou condescendência e a replicar, de dentro, com orgulho ou desdém, ao mesmo tempo fundado e obtuso. (27) (p. 57)

Aproximar o longe e conquistar distâncias adentro do novo plano europeu depende do poder de circulação e mobilidade entre pessoas. Para Moby Dick essa é a forma, com efeito, de quebrar velhos preconceitos. Deslocação e novidade são essenciais à vida; uma liturgia para o corpo e para a alma abertos ao horizonte infinito das coisas e ao mesmo tempo atentos ao seu próprio ser, eos seus pequenos mundos, às suas mais autênticas convicções, num vaivém imparável que é ero si o prenúncio de «novos cruzeiros, pois, mal acaba uma longa e perigosa viagem, logo outra se prepara, e depois desta uma terceira e uma quarta, e assim por diante, numa interminável sucessão. Tal é a natureza intolerável e intérmina de todos os empreendimentos humanos» (28). Tarefa espinhosa, concorda a Baleia, mas urgente cm cada homem e de modo mais premente no ilhéu, estimulado que devia ser para sair da sua terra (se não necessariamente em sentido físico, obrigatoriamente ao menos em termos espirituais) e a ela voltar, pois é na condição de retorno que o homem se completa na dupla visão, que o coloca nesse «estado de transição – nem lagarta nem borboleta» (29), numa «combinação [que] não produz crentes nem infiéis, mas faz um homem daquele que as contempla a ambos com idêntica visão» (30).

Moby Dick celebra hoje com maior vigor esta sua mensagem vinda de tempos imemoriais quando terra, mar e céu eram uma e a mesma coisa. Sinais há de mudança, pressente e anuncia ela. É que a mobilidade é cada vez mais um facto. Por isso, está por perto – pensa a Baleia – a concretização de uma atlanticidade desde há muito adiada, decorrente de «uma atitude do povo português [que] perante o mar é ambígua. O carácter geral é marítimo, a tradição é do mar, mas [...] os portugueses não vão muito além da orla da praia» (31). Sim – pondera Moby Dick –, tal como os habitantes de Manhattan que atraídos pelo mar se deixam ficar pelo «limiar extremo da terra [...]. Têm de se aproximar da água, tanto quanto possível, sem nela caírem.» (32)

E enquanto o fim do século rola cada vez mais para o desequilíbrio social, a incerteza e a desconfiança, o desenraíza mento, a ausência de referências, o esquecimento e a quebra de relações humanas, vai a ilha sendo redescoberta como espaço-outro de intervalos e silêncios, de reabilitação e possibilidade de auto-reconstrução. A ilha acalentada pelo espírito de Moby Dick oferece, por via agora deste seu reconhecimento, espaço sacramental para a redenção de uma humanidade a saque sob a ameaça de extinção (tal como a Baleia e a própria ilha), num último suspiro de luta contra a «mega-morte». (33)

Desta forma, o olhar de fora sobre a ilha já não é o de quem a visita, a observa ou dela fala; é um olhar empático, de igual para igual, em mútua relação e interdependência, na plena aceitação do Outro e de Si, com paixão e identificação, pois «as vozes que chegam [agora] de fora vêm não apenas em visita, mas também para nos amar e ouvir, para nos escutar, para nos viver.» (34) Urge com efeito – pondera Moby Dick – criar uma ética ou poética das ilhas, e elevar a transitoriedade da geografia e da história daquela gente à permanência da simbologia, à fidelidade das suas mais variáveis representações (para além desse seu olhar interior, que ao longo da solidão dos tempos perseverou atento às possibilidades infinitas de uma natureza em palimpsesto movimento, contornando e definindo esse modo de ser-se português em terras atlânticas) (35). Do cruzamento desses olhares resulta agora uma narrativa ímpar na história do arquipélago (36). Terá tido o seu início com Antonio Tabucchi, apresentando-se a partir daí inexaurível em sedução, enamoramento e franca magia. Outros ventos sopram sobre o destino daquelas ilhas, que para Romana Petri (para falar de mais uma escritora italiana), segundo confessa a João de Melo natural daquele arquipélago, «são porventura o último lugar do mundo onde ainda se pode mudar de vida; ou cultivar, em alternativa, a ilusão do repouso do amor e da eternidade, na vida que o destino nos reservou» (37).

Ponto vital, porque intersecção de energias, constituem as ilhas hoje espaço de descompressão: um intervalo, uma alternativa, ou outra versão de uma vida nova a construir através de perspectivas-outras adquiridas. Já não mais exílio ou prisão – já não mais feridas nem harpões – mas lugar de convergências e interrelações, prenúncio e morada para mútuas reflexões, para o amadurecimento intelectual, afectivo e emocional, na recuperação de laços e referências esquecidas, no mundo planetário em que cada vez mais se dilui o humano. Tudo isso induzindo o homem, por outro lado, ao desejo e necessidade de retorno à terra, ao contacto com as coisas sem nome, ao sabor do autêntico e à escuta aconchegada da Natureza, à troca e à partilha. São brancas as ilhas, no seu constante intervalar um contraponto por isso ao cansaço da velha Europa (de duras competitividades, guerra e luto) que nas ilhas poderá colher a revitalização indispensável à reconquista do humanismo perdido. (38) Uma revitalização sempre em duplo movimento, servindo a ilha o continente e o continente a ilha, cada cara-metade em diálogo profuso para a assunção plena de uma atlanticidade de fecunda esperança feita ao longo dos séculos, mas a não ser mais evadida:

PRECE

Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.

Mas a chama, que a vida em nós criou,
Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguê-la ainda.

Dá o sopro, a aragem – ou desgraça ou ânsia –,
Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistemos a distância –
Do mar ou outra, mas que seja nossa!
(39)

E se assim Portugal a Distância conquistar, através de uma final concretização da sua dupla natureza – continental e insular, terrestre e marítima –, numa espécie de diálogo, complementaridade e confronto com cada uma das suas partes, então:

a baleia sobreviverá sempre e, erguendo-se na mais alta crista da maré equatorial, fará jorrar o seu espumoso desafio aos céus. (40)

NOTAS:

(1) Expressão de Antonio Tabucchi, no seu bonito texto, «Uma baleia vê os homens», in Mulher de Porto Pim, 2ª ed., trad. Mª Emília Marques Mano, Lisboa, Difel, s/d p. 94.

(2) Vide mapa das contentes marítimas, em forma de ovo, in S. Gofas, «The littoral Rissoidae and Anabathridae of S. Miguel, Azores». Açoreana, ponta Delgada. Boletim da Sociedade de Afonso Chaves, Out. 1990, 124 – um género De (segundo palavras de C. G. Jung, Commentaire sur le Mystire de la Fleur d'Or, Paris, Albin Michel, 1979, p.42) «círculo sagrado interior, origem e fim da alma, e que contém esta unidade da vida e da consciência outrora possuída depois perdida e que é urgente recuperar»; uma unidade de vida a cuja imagem recorre Nemésio cm muita da sua poesia como, por exemplo: «O Ovo», Nem Toda a Noite a Vida, (publicado em 1938) in Obras Completas, vol. II, Poesia, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1989, p, 41 e «O Ovo que deixei bicado e quente, / vazio de mim, no mar / E que ainda hoje deve boiar, ardente / Ilha! / E que ainda hoje deve lá estar», in O Bicho Harmonioso, Poesia (1935-1940), Lisboa, Livraria Morais, 1961, p. 20.

(3) A título de exemplo, refira-se que ainda nas enciclopédias oitocentistas, os Açores eram considerados «ilhas de África». Cf. D'Ayezac, Îles de l'Afrique, Paris, Férmin Didot Frères, 1848. Por isso, no princí pio do século XX, ainda se faziam estudos do género de Paul Choffat, et. al., «Açores – a que parte do mundo devem pertencer?», sep. Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa, nº 20, Série 1-6, 1903, pp. 357-66. Concluía-se então que os Açores eram biologicamente europeus – tese reconfirmada por Jorgen Knudsen, «Observations on reproductive strategy and zoography of some marine panasobranch gastropuds (mollusca) from the Azores», Açoreana, Ponta Delgada, Boletim da Sociedade Afonso de Chaves, 1995, pp.135-58. O mesmo já não se poderá dizer da posição geológica, geográfica e oceanográfica, como vimos em D'Ayezac, pois as ilhas surgem ainda hoje deslocadas nos mapas e no pensamento. Vide Vamberto Freitas, Entre a Palavra e o Chão. Geografias do Afecto e da Memória, Ponta Delgada, Jornal de Cultura, 1995, pp. 131-34. Tal como diria uma personagem de António Mega Ferreira, As Caixas Chinesas, Lisboa, Eds. Rolim, 1988, p. 48: «É tudo como num sonho, como se um monumental erro de povoamento tivesse plantado aqui uma população que se destinava a outro lugar qualquer no planeta». E no que respeita à precaridade daquelas ilhas, recorde-se aqui os frequentes terramotos e vulcões ao longo dos séculos, os quais fizeram emergir pequenas ilhas, para logo (ou num período máximo de dois ou três anos) desaparecerem. Vide os vários estudos de, entre outros, Arruda Furtado, José Agostinho e Afonso Chaves.

(4) Note-se que o papel estratégico dos Açores esteve desde o início até hoje sujeito a momentos de remissão total ao silêncio e aos esquecimento. Desses períodos áureos trata António José Telo, Os Açores e o Controlo do Atlântico, Porto, Eds. Asa, 1993.

(5) Fernando Pessoa, Mensagem, 13ª ed. Lisboa, Eds. Ática, 1979, p, 57. Referimo-nos, neste contexto, ao Espírito Santo, por o mesmo desde os primeiros tempos até aos nossos dias constituir a festa de maior fervor, que une todos os açorianos à volta de um mesmo espírito de abundância e solidariedade.

(6) Idem, ibidem, p. 31.

(7) Idem, ibidem, p. 101.

(8) «A Bela Adormecida», VIA LATINA, Forum de Confrontação de Ideias, Coimbra, Publ. DGAAC, 1991, p.70. Esta mesma ideia de incompletude está igualmente presente na perspectiva sociológica de Boaventura de Sousa Santos, Pela Mão de Alice. O Social e o Político na Pós-Modernidade, Lisboa, Afrontamento. 1994, e do ponto de vista criativo em Brigitte Paulino-Neto, A Melancolia do Geógrafo, trad. do francês por Lurdes Júdice, Lisboa, Eds. Asa, 1994, p. 93: «Quanto mais analisava os estratos (...) mais suspeitava que na origem das conquistas, das descobrimentos, da expansão marítima, tinha estado este sentimento de incompletude, de inconsistência, de vacuidade, que o meu desejo obsessivo de geógrafo se obstinava em querer mascarar.»

(9) Invocação a um Poeta e outros Poemas, Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1984, p. 48.

(10) Fernando Pessoa, op. cit., p. 60.

(11) Daniel de Sá, Ilha Grande Fechada (romance), Lisboa, Salamandra, 1992, p. 48.

(12) O 25 de Abril e a Autonomia Regional dos Açores, Ponta Delgada, Direcção Regional da Comunicação Social, s/d. pp. 66-67. Note-se que ainda nos finais do séc. XIX permanecia a ideia de colónia, em relação às ilhas. Vide Eça de Queirós, Uma Campanha Alegre, Lisboa, Risomnia Eds., 1988, p. 96: «A metrópole tem certas generosidades consideráveis com as colónias. Assim, com os Açores – que não são uma colónia, mas que pela distância, pelo abandono, pela separação de interesses, tem toda a fisionomia colonial».

(13) «Agarra é Ilhéu», Corsário das Ilhas, Lisboa, Livraria Bertrand, 1956, p. 45. E continua na p. 47: «Nós não temos medo de que o mar nos alague ou de que a terra nos falte: temos sempre presente, como salutar advertência, a sensação de que o Mundo é curto, e o tempo mais curto ainda [...]. É com os próprios olhos que tiramos do mar a terra que nos faltou».

(14) Destaque-se aqui, entre os diversos escritores açorianos, Álamo Oliveira, Itinerário das Ilhas, Angra do Heroísmo Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1982, no que diz respeito aos sentimentos derivados do factor distância. E no que concerne especificamente esta última, veja-se o que diz João de Melo, Dicionário de Paixões, Lisboa, D. Quixote, 1994, p.100: «De facto, se a distância não for, logo de partida, o pior inimigo das ilhas, ela é, pelo menos, o equívoco maior da sua presença no coração, no ouvido e nos olhos de quantos se limitam a escutá-las e a compreendê-las de longe». Por outras palavras, dir-nos-ia Vitorino Nemesio, Corsário das Ilhas, p. 129: «tudo no périplo de uma ilha alude ao possível na distância»; «Tudo para o ilhéu se resume cm longitude e apartamento. A solidão é o âmago do que está separado e distante», p. 41.

(15) Vitorino Nemésio, ibidem, p. 46. Contudo, na sua obra Sob os Signos de Agora, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1932, p. 241, mostrava como há formas de escape àquele condição insular: «Bem sei que o contacto com o mar enerva e desola. É forte de mais. Mas por isso mesmo: dá gume às unhas manucureiras, afia os cabelos borrifados da mousse atlântica, e desvia a mundanismo da sua fatal insignificância e limitação.» «O mar é não só o seu conduto terreal como o seu conduto anímico», p. 140.

(16) John Updike, poema incluído in The Sea Within. A Selection of Azoreon Poems (trad. George Monteiro; selecção e introd. Onésimo T. Almeida), Providence, Gávea-Brown,1983, p. 8.

(17) Vitorino Nemésio, «Açorianidade», Insula, nº 7 e nº 8, Julho-Agosto, 1932: «A geografia para nós vale outro tanto como a história. Como as sereias temos uma dupla natureza: somos de carne e de pedra. Os nossas ossos mergulham no mar.»

(18) Várias narrativas de viagem ficaram como testemunho daqueles que visitaram as ilhas no século XIX. Vide, a título de exemplo, João Manuel Cabral Leite, Estrangeiros nos Açores no Século XIX (antologia). Ponta Delgada, Signo, 1991. Quanto aos continentais que, no mesmo período até às primeiras décadas do século XX, deixaram registo da sua passagem pelos Açores, temos, entre outros: Feliciano de Castilho, Bulhão Pato, Garrett, Alexandre Herculano, Teixeira de Pascoaes, Leite de Vasconcelos e Raul Brandão, com a sua célebre obra, Ilhas Desconhecidas, marco importante na história da literatura daquele arquipélago.

(19) Não raras vezes Portugal aparece associado metaforicamente a ilha. Vide, por exemplo, Eduardo Lourenço in Augusto S. Silva e V. O. Jorge (orgs.), Existe uma Cultura Portuguesa?, Lisboa Afrontamento, 1993, p. 39: «Nós funcionámos sempre como uma ilha»; António José Saraiva, A Cultura em Portugal, Amadora, Livraria Bertrand, 1982, pp.86113: Comandante Virgílio de Carvalho, Nação e Defesa, Lisboa, Execução Gráfica do CEGRAF/EX, 1983, p.18: «O refúgio procurado pelos Portugueses no Atlântico como estratégia de sobrevivência face à Espanha, justifica, efectivamente, a afirmação de que o Continente se tem comportado geo-estrategicamente como uma autêntica ilha, o que, juntamente com as ilhas atlânticas, dá lugar a uma espécie de 'quase arquipélago'».

(20) Op. cit., no prólogo à obra, p. 8.

(21) Mircea Eliade, O Sagrado e o Profano, trad. Rogério Fernandes, Lisboa, «Livros do Brasil», s/d, p.140: «Uma das imagens exemplares da Criação é a Ilha que subitamente se 'manifesta' no meio das vagas. Em contrapartida, a imersão na água simboliza a regressão ao preformal, a reintegração no modo indiferenciado da existência. A emersão repete o gesto cosmogónico da manifestação formal; a imersão equivale a uma dissolução das formas.» Cf. tudo isto, em termos reais, acerca das ilhas, que apareceram para depois voltarem ao fundo do mar, numa sequência persistente ao longo dos séculos, pós-povoamento: Frederico Machado, «Natureza das deformações da crusta nos Açores», Açoreana, vol. V, Fas. II, 1954, pp. 175-82; Afonso Chaves, «Erupções submarinas nos Açores», Açoreana, vol. V, Fas. IV, 1960, pp. 132-61; José Agostinho, «Actividade Vulcânica nos Açores», Açoreana, vol. V, Fas. IV, pp. 362-452.

( 22) Para além dos nomes acima referidos, registe-se aqui a afirmação de Ralph Roger Glockler (escritor e poeta alemão, a viver em Portugal), Viagem Vulcânica. Uma Saga Açoriana (romance tecido da interrelação de ciência e ficção, à boa maneira de Melville), trad. Isabel Mafra, Braga, Tilgráfica, 1996, p.123: «As placas eurasiática e africana movem-se aqui paralelamente. Repito: o ponto de intersecção de três placas litosféricas, o triple point, encontra-se algures na Região dos Açores: ao que acrescenta na p. 127: tal fractura, «inclusive, influencia geodinamicamente o continente português. O terramoto que destruiu Lisboa em 1755 teve origem em movimentos de compensação neste sistema de fracturas.»

(23) A data da descoberta dos Açores continua uma incógnita É um problema que permanece por resolver, segundo Luís Albuquerque, Introdução à História dos Descobrimentos, Coimbra, Atlântida, 1962, pp. 206-20, e Os Descobrimentos Portugueses, Lisboa, Publs. Alfa, 1983, pp. 57-74. Vide Charles Verlinden «Formes féodales et domaniales de la colonization portugaise», Revista Portuguesa de História, Coimbra, s/n, 1969. Cf. Manuel Monteiro Arruda, Colecção de Documentos Relativos ao Descobrimento e Povoamento dos Açores, Ponta Delgada, Oficina de Artes Gráficas, 1932, pp. XIII-LXXX.

(24) Era uma Vez o Tempo I, Ponta Delgada, Instituto Cultural de Ponta Delgada, 1988, p. 92. Sobre a «dualidade conflituosa que oscila entre o intimismo e a abertura ao mundo», diz Fernando Aires, p. 65: «Por pouco não somos místicos. Por pouco também não somos 'conquistadores' de continentes. Ficámos sempre a meio caminho entre o ter e o ser, entre a realidade e o sonho, entre a realização e a frustração simbolicamente marcados no mapa a meio do Atlântico, entre dois mundos, sem pertencermos decididamente a nenhum...»

(25) António José Telo, op. cit., p. 172.

(26) Idem, Ibidem, p.529: ...«o aumento da importância dos Açores é um factor objectivo, que não depende da consciência e aproveitamento que Portugal tem dele. Pelo contrário, as potências que dominam o Atlântico fazem os planos para os Açores, independentemente da posição política de Portugal. A forma e a altura em que os planos são aplicados depende sobretudo da grande estratégia e não da política portuguesa.»

(27) Nós e a Europa ou as duas razões, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1988.

(28) Herman Melville, Moby Dick. A Baleia Branca, trad. Joaquim L. Duarte Peixoto, Lisboa, Europa-América, cap. XIII. p. 83.

(29) Idem, Ibidem, cap. IV, p. 52.

(30) Idem, Ibidem, cap. LXXXV, p. 112 (o sublinhado é nosso). Aquela combinação constitui a utopia de Aldous Huxley, A Ilha, trad. Virgínia Motta, Lisboa, «Livros do Brasil», 1962, p.162. «O mais extravagante é a loucura de pretender 'casar' o inferno com o céu. Mas se se persistir nessa tremenda loucura, que tremenda recompensa! Isto desde que, naturalmente, se persista com inteligência».

(31) Américo da Silva Santos (capitão de mar e guerra), «Que poder marítimo para Portugal», Anais do Clube Militar Naval, nº 8, Lisboa, 1994, p. 98. Para sustento da sua tese, o autor refere-se a Mário Soares (então Presidente da República e lutador tenaz por um Portugal atlântico) nas inúmeras ocasiões em que havia afirmado «o interesse vital do mar para Portugal e a urgente necessidade de se promoverem políticas para o desenvolvimento das actividades económicas, científicas, culturais e de lazer ligadas aos oceanos [...]». Em 1991, em discurso proferido no ISNG, declarou «ser o mar, especialmente o Atlântico Norte e Sul, uma das vocações permanentes da Nação e exortou o Instituto à reflexão e à definição dos seus problemas para o encontro de caminhos que conduzam ao aumento do Poder Marítimo Nacional», p. 95. Neste mesmo número dos Anais, vide capitão-tenente Oliveira e Lemos, «A função estratégica dos Açores e da Madeira numa estratégia de defesa militar de Portugal» (com referências também a Mário Soares, relativamente à mesma questão), pp. 157-64. Sobre o mesmo assunto se debruça Lucas Pires, O que é a Europa, Lisboa, Difusão Cultural, 1992.

(32) Herman Melville, op. cit., cap. I, p. 28.

(33) Edgar Morin, «O acasalamento das baleias», As Grandes Questões do nosso Tempo, 4ª ed., Lisboa, Editorial Notícias, 1994, pp. 265-75.

(34) João de Melo, «Os Açores e os açorianos aos olhos de Antonio Tabucchi», Atlântida, vol. XLII, Angra do Heroísmo, 1996, p. 57.

(35) Sobre a larga produção literária nos Açores, vide Onésimo T. Almeida, Açores, Açorianos, Açorianidade, Ponta Delgada, Brumarte, 1989; idem, org., A Questão da Literatura Açoriana, Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1983; José Martins Garcia, Para uma Literatura Açoriana, Ponta Delgada, Universidade dos Açores, 1987; António Machado Pires, «Os Açores antes do 25 de Abril – alguns indicadores culturais», in Pensar os Açores Hoje, Forum Açoriano, Ponta Delgada, Instituto Cultural de Ponta Delgada, 1997; Vamberto Freitas, O Imaginário dos Escritores Açorianos, Lisboa, Salamandra, 1994, Adelaide Batista, João de Melo e a Literatura Açoriana, Lisboa, D. Quixote, 1993.

(36) De igual optimismo (embora noutro contexto) parece comungar Fernando da Costa, op. cit.: «Hoje Portugal encontra-se no mesmo plano .dos povos que recriou; ao autonomizar-se deles igualou-se-lhes, pode deixar de ser explorador e paternalista [...], pode renascer, reorganizar-se com eles». Daquele duplo olhar resultam várias obras de ficção de profunda identificação com a obra açoriana. Do continente: Maria Orrico, Terra de Lídia, Lisboa, Salamandra, 1994; António Mega Fcrrcira, op. cit.; Francisco José Viegas; Crime em Ponta Delgada, Lisboa, Europa-América, 1989; Domingos Pimenta, A Estranha Ideia do Capitão Diodórus, Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1978; José Leon Machado, Ilhado em Circe, Chaves, OPSIS, 1996; Joaquim Manuel Magalhães, Do Corvo a Santa Maria, Lisboa, Relógio d'Água, 1993. Do estrangeiro: Antonio Tabucchi, op. cit.; Anne Meistersheim (francesa), Le Géomètre de Paline, Ajjacio, Eds. Allain Piazzala, 1994; Katherine Vaz (americana), Saudade, New York, St. Martins Press, 1994; Ralph Roger Glockler (alemão), op. cit.; Romana Petri, Il Baleniere delle Montagne (no prelo); John Updike (americano), «Grandes navios verdes», in op. cit.; Pierluigi Bragaglia (italiano, a viver nas Flores), Lucas e os Cacenas, Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1994.

(37) Cf. João de Melo, «Os Açores e os Açorianos...», p. 56.

(38) Num mundo cada vez mais desorientado e fragmentado, desencadeia-se ao mesmo tempo uma necessidade de procura de um lugar mais calmo e seguro que evite extravios e perdas. Sobre as ilhas, naquilo que elas são em si mesmas e na alternativa que podem oferecer ao mundo exausto, disserta (sob todas as perspectivas – económica, turística, cultural, geográfica, histórica e simbólica) Françoise Péron, Des Îles et des Hommes. L'Insularité Aujourd'hui, Rennes, Eds. Ouest-France, 1993, p. 286.

(39) Fernando Pessoa, op. cit., p.73. Esse é o desfio ainda hoje colocado a Portugal: conquistar distâncias entre o continente e as ilhas; entre a atlanticidade que daí deriva e uma realidade-outra que está para além de todos os mares, a sua diáspora. Para isso há que, socorrendo-nos das palavras de C. G. Jung, op. cit., p. 38, adquirir um elevado grau de consciência que reúna o que está separado. Tal operação consistirá «em tomar conscientes os opostos, compreende sem dúvida também uma reunificação com as leis inconscientes da vida, e o objectivo desta unificação é a obtenção da vida consciente: a produção do Tao» – o Tao como método de aproximar distâncias.

(40) Herman Melville, op. cit., cap. CV, p. 194.

Adelaide Batista, revista Vértice, nº 78, Maio-Junho de 1997, pp. 48-54.

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